O Brasil avançou em um tratamento revolucionário para o câncer, que atingiu 81% de respostas positivas e 72% de remissão completa em casos de linfomas, leucemias e outros cânceres que afetam células B em pacientes testados com uma nova terapia CAR-T.
A CAR-T (Chimeric Antigen Receptor T-cell) é uma forma avançada de imunoterapia celular personalizada em que as células T do próprio paciente são coletadas, geneticamente modificadas para expressar um receptor (CAR) que reconhece um alvo tumoral, expandidas em laboratório e reinfundidas para atacar as células cancerígenas. Essa abordagem supera limitações da quimioterapia e tem mostrado respostas profundas em cânceres hematológicos refratários.
Em ensaios internacionais com produtos comerciais de CAR-T, taxas de resposta objetiva e remissão completa são substancialmente mais altas do que com quimioterapia tradicional, com alguns estudos indicando uma taxa de resposta entre 58% e 87% e remissão completa entre 68% e 93% dos casos, segundo estudo publicado no periódico World Academy of Sciences.
Agora, o Brasil, no Hospital Israelita Albert Einstein, registrou um avanço inédito com o desenvolvimento de sua própria terapia CAR-T, em um ensaio clínico feito 100% com tecnologia nacional e aplicado em pacientes-teste em parceria com o Ministério da Saúde.
O estudo foi aprovado pela Anvisa como o primeiro estudo clínico de fase I produzido em um hospital brasileiro, e as respostas foram muito positivas. Se a taxa de 72% de remissão observada durante os testes for comprovada em coortes maiores, a nova terapia, o ensaio CARTHIAE, pode ser um dos resultados globais mais significativos até então para essa espécie de terapia imunológica.
A CAR-T vem sendo usada há anos em países desenvolvidos como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, França, Espanha, Itália, Reino Unido, China, Austrália, Singapura e Israel, com dezenas de milhares de pacientes tratados e remissões duradouras em cânceres do sangue, segundo o Instituto Butantan. A taxa de resposta geral da terapia pode chegar a mais de 83%.
A terapia brasileira segue princípios internacionais, mas foi inteiramente desenvolvida e fabricada dentro do Hospital Albert Einstein, a partir de quatro fases: na primeira fase, o paciente passa pela leucoaférese, procedimento de retirada seletiva de suas células do sistema imunológico, os glóbulos brancos, que depois serão reintroduzidas com o mecanismo de combate ao câncer.
Depois, o sangue do paciente circula por uma máquina que separa linfócitos T, o tipo de célula imune usado na terapia, que são coletados e enviados para o laboratório GMP do Einstein. O paciente, nesse estágio, pode retornar para casa ou continuar internado, a depender de seu caso clínico. Por se tratarem das células do próprio paciente, a terapia reduz o risco de rejeição e de imunossupressão (debilidade do sistema imunológico).
Na segunda fase, há uma seleção e purificação dos linfócitos T do paciente, a fim de garantir um conjunto viável para ser ativado por anticorpos artificiais que imitam a sinalização gerada pelo próprio sistema imune. As células são ativadas com o vetor viral do gene CAR, responsável por combater os tumores celulares causadores do câncer.
Ao entrar nas células T, o gene CAR é inserido no DNA e reprograma os linfócitos para reconhecer as células malignas (células B, tipicamente CD19).
As células modificadas são colocadas em biorreatores e cultivadas por vários dias com o objetivo de produzir milhões de CAR-T a partir da amostra original retirada do paciente, e são congeladas em nitrogênio líquido para manter viabilidade até o momento de sua aplicação.
O ciclo completo, entre a retirada das células, sua ativação e o início da terapia de aplicação, dura entre duas a quatro semanas. As células são inseridas no paciente por via intravenosa, em um procedimento curto, que dura de 10 a 30 minutos, e os CAR-T se expandem no corpo entre o terceiro e o décimo dia.
A produção nacional do vetor viral demandou uma infraestrutura hospitalar própria e de custo potencialmente mais baixo, além de um tempo de fabricação menor da terapia (que, em geral, pode durar até 10 semanas).
A consolidação de ensaios como o CARTHIAE pode abrir precedentes para o desenvolvimento de outras terapias celulares e genéticas no Brasil, e os resultados de fase 1 comprovam a segurança do tratamento; as fases 2 e 3 serão necessárias para confirmar a eficácia em amostras maiores.
Mas os sinais são muito positivos: com taxa de resposta de 81% e mais de 70% de remissão, a tecnologia, embora ainda de custo elevado, promete ser uma inovação no tratamento de tumores hematológicos.
Nos Estados Unidos, produtos de CAR-T, como o mais famoso Tecartus, podem chegar a custar até US$ 373 mil por infusão. No Brasil, o custo de um tratamento com CAR-T importado pode chegar a aproximadamente R$ 2,5 milhões por paciente.
Estimativas de projetos de produção local sugerem que, com insumos e mão de obra brasileiros, os custos poderiam cair para algo entre 10% e 15% do valor de mercado atualmente praticado, ou seja, potencialmente na casa de R$ 200 mil a R$ 300 mil por tratamento, segundo o Ministério da Saúde.
A Fiocruz já firmou acordos que, se implementados, apontam para redução de até 90% no custo da terapia, levando de cerca de US$ 350 mil por dose para algo em torno de US$ 35 mil por dose (aproximadamente R$ 175 mil), com produção nacional da tecnologia.
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