Um relato no Reddit descreveu o caso de uma mulher com diagnóstico de esquizofrenia que teria sido internada após ver um anúncio da Apple TV na tela de sua geladeira Samsung. A mensagem dizia “sentimos muito por ter chateado você, Carol” e era uma propaganda da série Pluribus.
Só que Carol também era o nome da dona da geladeira. Ela interpretou como comunicação pessoal e entrou em crise. Nenhum veículo confirmou a história, mas pouco importa. Se não aconteceu ainda, é questão de tempo até equipamentos conectados gerarem esse tipo de interação invasiva.
Por conta da repercussão, a Samsung passou a oferecer opção para desativar anúncios nas geladeiras apenas em novembro. Mesmo assim, o problema persiste. Você compra um produto, paga por ele, leva para casa, e a empresa decide remotamente exibir propaganda na tela. Não é subsidiado, não é emprestado. É seu.
Em um outro caso, um homem nos EUA precisou criar seu próprio sistema de garagem porque a empresa MyQ cortou integração com Apple Home e Google Home, exigindo assinatura para controlar o portão. Ele fundou a RATGDO (Rage Against the Garage Door Opener) e vendeu dezenas de milhares de unidades para quem também perdeu controle sobre a própria casa.
A Kohler, fabricante de louças de banheiro e equipamentos de cozinha, lançou uma câmera inteligente que fotografa o interior do vaso sanitário e analisa fezes para orientar sobre saúde intestinal.
A empresa anunciou criptografia de ponta a ponta, mas um pesquisador de segurança revelou que era apenas criptografia em trânsito. A Kohler tinha acesso aos dados nos próprios servidores e poderia usá-los inclusive pra para treinar sistema de inteligência artificial. Após denúncia, a empresa mudou a descrição no site.
E pensar que o produto custa US$ 599 mais uma assinatura obrigatória de US$ 6,99 mensais. Você paga centenas de dólares e uma mensalidade para ter suas fezes analisadas por algoritmos treinados com dados de outros usuários.
Tudo vira assinatura. Carros da Tesla cobram por recursos que já estão no veículo. A BMW tentou cobrar pelo aquecimento do banco na Alemanha. Nossos livros, discos, filmes… todos na nuvem atrás de um paywall. Quando há reclamação, a resposta é “está nos termos de uso” ou “você pode desativar nas configurações” em algum lugar enterrado em 47 cliques.
A pergunta deixou de ser “quanto custa” e virou “por quanto tempo será meu”.
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Obs: Obrigado pela leitura ao longo do ano! A coluna dará uma breve pausa e retorno em fevereiro. Enquanto isso, fiquemos conectados através do https://www.resumido.cc.
* Bruno Natal é jornalista, documentarista e apresentador do podcast RESUMIDO (www.resumido.cc), sobre o impacto da tecnologia em todos os aspectos das nossas vidas. Disponível nas principais plataformas de streaming.
