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Mais de US$ 100 Milhões em Ativos Desaparecem em Esquema Imobiliário nos EUA

by admin

The Business Roundup/Melissa Bill

Brandon “Dutch” Mendenhall, cofundador da RAD Diversified, é autor de “Money Shackles”, um livro sobre como se libertar de dificuldades financeiras. Agora, seus investidores se perguntam o que aconteceu com o dinheiro deles

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Em janeiro de 2023, Brad Carr entrou para a RAD Diversified, uma empresa de investimentos imobiliários sediada em Tampa, na Flórida, logo após se aposentar depois de 27 anos no Exército dos Estados Unidos. Contratado como diretor de iniciativas estratégicas da RAD, Carr afirma que atuava, na prática, como chefe de estratégia. Formado pela Academia Militar de West Point, Carr, hoje com 51 anos, passou grande parte da carreira na polícia militar antes de migrar para as chamadas “PSYOPs”, unidade responsável por usar informação e propaganda junto a populações estrangeiras para atingir objetivos militares.

Usando seminários e técnicas de marketing digital, a RAD Diversified já oferecia uma ampla variedade de programas de investimento a centenas de investidores. Seu principal produto era um fundo imobiliário não listado em bolsa (REIT), que dizia comprar casas unifamiliares em Los Angeles, Houston, Filadélfia e Tampa.

Mas a RAD também afirmava ter fundos de Opportunity Zone – que oferecem benefícios fiscais para investimentos imobiliários em áreas economicamente deprimidas –, um fundo cripto que investia principalmente em NFTs e um clube exclusivo de investimentos chamado Inner Circle RAD, que custava US$ 50 mil para dar acesso a parcerias em negócios imobiliários.

A empresa não atuava apenas com participação societária: também oferecia aos investidores a possibilidade de participar de empréstimos, prometendo retornos superiores a 10% ao ano. No total, a companhia divulgava que seu portfólio imobiliário somava US$ 250 milhões.

Esquema de pirâmide financeira

Duas semanas após começar no novo cargo, Carr — que respondeu a contragosto às insistentes perguntas da Forbes — recebeu um pedido surpreendente do CEO da RAD, Brandon “Dutch” Mendenhall. O chefe queria que ele pesquisasse como Bernard Madoff, autor do maior esquema Ponzi da história, foi descoberto. O documentário da Netflix “Bernie Madoff: O Golpista de Wall Street” havia acabado de ser lançado e, sem questionar o pedido inusitado, Carr reassistiu à série e montou uma apresentação para a liderança. Sua principal conclusão: Madoff conseguiu permanecer indetectável porque manteve os detalhes fora de vista – e porque ninguém quis estragar os retornos “mágicos” fazendo perguntas.

Pouco depois, Carr recebeu uma nova missão do CEO: elaborar um plano de crescimento e preparar materiais para potenciais investidores de family offices. Essencial para essa tarefa eram os dados que comprovassem as alegações da RAD de um retorno de 150% em quatro anos. No mesmo período, a partir de 2019, o fundo de índice imobiliário da Vanguard, com US$ 64 bilhões em ativos, havia registrado um ganho de apenas 18%. Os números fornecidos pelo então diretor financeiro da RAD, Andrew Nonis, mudavam de uma versão para outra. As diferentes áreas do negócio não batiam. Em junho de 2023, seis meses após entrar na empresa, Carr decidiu que não conseguiria realizar o trabalho para o qual havia sido contratado e pediu demissão.

Nos meses seguintes à sua saída, investidores afirmam que as distribuições de renda dos fundos da RAD começaram a desacelerar e depois cessaram sem explicação. Pagamentos aos investidores do REIT foram perdidos. Os juros dos empréstimos feitos à RAD não foram pagos. A empresa atribuiu o aperto de caixa à desaceleração geral nas vendas de imóveis, segundo investidores. No fim de 2023, as taxas de hipoteca se aproximavam de 8%, o que levou muitos a acreditar na versão da RAD.

A situação piorou em fevereiro de 2024. No mesmo dia em que a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) suspendeu a capacidade do RAD Diversified REIT de captar novos recursos, ao declarar abandonada sua declaração de oferta, a empresa congelou os resgates dos investidores.

Investidores de parcerias afirmam que seus pagamentos mensais pararam por volta do mesmo período. Valores devidos por empréstimos também deixaram de ser pagos. A comunicação tornou-se escassa. Em algumas parcerias, imóveis foram vendidos sem aviso aos sócios proprietários.

Então, em julho de 2025, com os resgates ainda congelados, o procurador-geral da Flórida, James Uthmeier, anunciou a emissão de intimações após receber denúncias de que a RAD não estaria usando o dinheiro dos investidores conforme divulgado. Em comunicado público, Uthmeier afirmou: “Isso parece ser um esquema Ponzi”.

A RAD contestou a acusação em sua resposta inicial ao tribunal. A empresa alegou que o Departamento de Assuntos Jurídicos do procurador-geral da Flórida não tinha jurisdição e que os registros solicitados deveriam ser obtidos junto à SEC, que – segundo os próprios donos da RAD informaram aos investidores – também conduzia uma investigação. Na ocasião, a RAD afirmou já ter fornecido à SEC mais de um milhão de páginas de documentos da empresa.

Segundo um investidor que passou um período no conselho da RAD e teve acesso aos livros contábeis, havia diversas execuções hipotecárias no portfólio imobiliário da empresa, além do desaparecimento de ativos estimados em cerca de US$ 100 milhões.

Com ações judiciais se acumulando e investigadores vasculhando seus registros e documentos, a RAD Diversified está atualmente no centro de um dos maiores escândalos do sul da Flórida.

Consequências da Lei JOBS

O caso é mais um exemplo de promotores oportunistas que se aproveitam da Lei JOBS, de 2012, usando dispositivos conhecidos como Regulation D e Regulation A+, que permitem que empresas captem silenciosamente milhões de dólares sem passar por um IPO, com exigências mínimas de divulgação e regras de marketing mais frouxas.

Os REITs privados se tornaram um terreno fértil para empreendedores da era da Lei JOBS. Diferentemente dos REITs listados em bolsa – que negociam em mercados públicos, enviam relatórios regulares à SEC e têm preços de ações facilmente verificáveis —, os REITs não negociados limitam resgates, oferecem muito menos transparência e frequentemente cobram taxas elevadas. Segundo dados da Blue Vault, empresa de pesquisa que acompanha investimentos alternativos, os ativos de REITs não listados cresceram de US$ 78 bilhões no início da década de 2010 para US$ 178 bilhões em 2025.

Quem são os fundadores da RAD

A RAD Diversified leva o nome de seus fundadores: Randle Bowling, que saiu da empresa em 2020; Brandon “Dutch” Mendenhall; e Amy Vaughn. Mendenhall, de 46 anos, cresceu em Iowa, jogou beisebol e depois atuou como treinador na Universidade de São Francisco antes de migrar para o mercado imobiliário. Segundo registros da empresa, ele iniciou sua carreira como recrutador executivo focado nos setores imobiliário e bancário, antes de lançar um negócio de educação imobiliária chamado Tax Auction Investors durante a onda de execuções hipotecárias que se seguiu à crise de 2008.

Amy Vaughn, também de 46 anos, é natural da Filadélfia e se mudou para a Flórida em 2001, aos 21 anos, segundo seu perfil no LinkedIn, onde afirma ter obtido licenças imobiliárias e de seguros (ela também diz que, naquele mesmo ano, já comandava uma empresa multimilionária). Sua presença online é marcada por textos e imagens motivacionais, com citações inspiradoras e referências frequentes a garra, ambição e perseverança, além de destacar seu trabalho filantrópico com a Joshua House, uma ONG de Tampa que apoia crianças vítimas de abuso e negligência. Ex-funcionários afirmam que Vaughn era a força de vendas por trás dos seminários imobiliários de Mendenhall.

Ex-colaboradores dizem que o grupo começou trabalhando com imóveis problemáticos e vendas a descoberto (short sales), antes de migrar para o negócio de seminários imobiliários. Eles cuidavam de marketing, vendas e operações administrativas para nomes conhecidos do setor, incluindo o canadense Dustin Hahn, especializado em tax liens (penhora fiscal). Em uma entrevista para um podcast em 2024, Mendenhall afirmou que decidiu subir ao palco e vender sua própria experiência porque muitos dos “gurus” não investiam pessoalmente em imóveis ou ensinavam técnicas ultrapassadas. Segundo ele, os alunos começaram a pedir para investir ao seu lado, em vez de apenas pagar por uma mentoria — o que levou ao lançamento de três fundos imobiliários em 2015, focados em casas unifamiliares.

Esses primeiros fundos, segundo ex-funcionários, eram relativamente pequenos (um registro de 2018 mostrava que um deles possuía 46 casas e US$ 5,8 milhões em ativos totais) e limitados por restrições de captação.

Em 2017, o grupo formou o RAD Diversified REIT, usando ofertas sob as regras Regulation A e Regulation D para levantar valores maiores junto a um grupo mais amplo de investidores. A RAD, incluindo Vaughn e Mendenhall, não respondeu aos diversos pedidos de comentário feitos para esta reportagem.

Com o tempo, o negócio deixou de priorizar seminários caros e passou a buscar e investir em seus próprios projetos imobiliários. Pessoas que trabalharam na empresa dizem que os fundadores acreditavam ser capazes de fazer o mesmo que seus clientes – e que haveria mais dinheiro a ganhar do que apenas promovendo eventos.

Inicialmente, focaram em criar pequenas parcerias para aquisição de imóveis. Essas iniciativas cresceram e se transformaram em programas de investimento estruturados, e um fundo deu origem a vários outros. À medida que a empresa se expandia, Mendenhall e Vaughn chegaram a lançar a Alternative Investment Association, um grupo de membros que cobrava ao menos US$ 5 mil por ano.

As vítimas da fraude

Tom Nagy, um empresário aposentado de 57 anos, morador dos arredores da Filadélfia, diz que investiu em parcerias da RAD após ingressar no Inner Circle da empresa. Em dois meses, comprometeu cerca de US$ 330 mil em quatro parcerias residenciais (três casas na Pensilvânia e uma na Califórnia), além de um empréstimo de US$ 100 mil à RAD e uma participação de 1% em um campo de golfe, o Wentworth Club, nos arredores de Tampa, que pertencia a outra empresa ligada à RAD, a Omnico Golf – que, segundo seu site, planejava adquirir seis campos até setembro de 2025.

Nagy afirma que a abordagem de vendas ganhou um tom pessoal quando ele viajou a Idaho para um retiro de investidores da RAD em outubro de 2023. Logo no início da viagem, assistiu a uma apresentação que mostrava um imóvel que ele já possuía como se ainda estivesse à venda.

Ao questionar, foi informado de que o sistema “não havia sido atualizado”. A comunicação ficou mais difícil depois disso. Ele esperava receber aluguéis de suas parcerias e juros do empréstimo. Não veio nada. Os extratos listavam taxas e custos de reparo que ele não conseguia comprovar. Ao pedir as notas fiscais, diz que nenhuma foi enviada. No fim de 2023, foi informado que os quatro imóveis das parcerias haviam sido vendidos. Um apresentou um pequeno lucro que ele nunca recebeu; dois deram prejuízo; e o quarto, segundo ele, resultou em uma cobrança de US$ 40 mil por reformas que ele nunca viu. Até agora, recuperou apenas US$ 1.900 dos US$ 330 mil investidos.

Lonnie Phillips, ex-paramédico de 61 anos, da Virgínia, teve uma experiência semelhante. Ele entrou para o Inner Circle da RAD em outubro de 2021 após ser informado de que as parcerias eram acordos genuínos de 50/50, com a RAD investindo ao lado dele. Isso era importante para ele, segundo Phillips.

Ele investiu em dois imóveis, incluindo uma casa à beira de um lago em Tampa, situada em um terreno de 125.000 m² às margens do Half Moon Lake, com piscina, apartamento para hóspedes e cerca de 50 metros de frente para a água.

A Zillow, maior plataforma online de imóveis dos Estados Unidos, atualmente estima o valor do imóvel em cerca de US$ 1,6 milhão. Phillips acreditava que ele e a RAD possuíam cada um metade da propriedade. Mais tarde, descobriu que a RAD havia vendido a maior parte de sua participação para outro investidor da própria empresa, ficando com apenas cerca de 10%.

Segundo ele, a mudança ocorreu sem seu conhecimento e comprometeu toda a estrutura de incentivos que acreditava estar comprando. O imóvel acabou sendo vendido e, de acordo com Phillips, nenhum dos investidores recebeu qualquer valor. O outro investidor processou a RAD na Flórida e obteve uma sentença à revelia.

Para aumentar sua frustração, Phillips afirma ainda que um de seus imóveis de parceria foi apresentado em uma chamada de Zoom com investidores da RAD como um ativo lucrativo do REIT. Quando levantou a questão, diz que foi ignorado. Tirando uma pequena quantia de distribuições do REIT relacionada a um resgate anterior, Phillips – que investiu cerca de US$ 300 mil no total com a RAD – afirma não ter recebido pagamentos de nenhuma de suas parcerias.

Para onde foi o dinheiro?

Se Nagy e Phillips se perguntavam para onde foi o dinheiro, Jeff Thomas diz que chegou mais perto da resposta. Thomas, investidor de 66 anos em parques de trailers e veículos recreativos, possuía cerca de 5% das ações em circulação do REIT, tornando-se o maior acionista externo.

Ele também participou de um podcast da empresa e promoveu a RAD para novos investidores. Seu primeiro aporte foi em 2018, e ao longo do tempo investiu US$ 1,5 milhão nos programas da RAD. Ele recebeu distribuições do REIT, retornos de parcerias e juros do empréstimo feito à RAD até o início de 2024, quando os pagamentos cessaram. Disseram que se tratava de um problema temporário de fluxo de caixa.
No meio de 2025, Thomas passou a pressionar por mais transparência. Em julho, foi nomeado para o conselho do REIT.

Outros candidatos ao conselho, segundo ele, desistiram porque a RAD não conseguiu contratar um seguro para diretores e executivos devido aos processos em andamento. Entre eles está uma ação civil com base na lei RICO movida pelo apresentador de rádio Buck Sexton, que investiu “mais de US$ 100 mil” e afirma que a RAD o enganou e não forneceu o “acesso direto a investimentos imobiliários subvalorizados” que lhe havia sido prometido. A RAD pediu a extinção do processo, alegando que as acusações são falhas e fora da jurisdição federal. Thomas contratou sua própria cobertura e ingressou no conselho.

Já como conselheiro, Thomas teve acesso às contas bancárias da RAD e começou a revisar transferências e saldos. O que viu levantou preocupações imediatas sobre a forma como o dinheiro circulava entre as diferentes entidades da RAD. Em meados de outubro, encontrou-se com Mendenhall e Vaughn no campo de golfe Wentworth, nos arredores de Tampa (por meio de outra empresa, Mendenhall e Vaughn eram donos do campo e, até a metade de 2025, ainda buscavam ativamente novos investidores para o projeto).

Ao longo de vários dias, Thomas diz que pressionou a gestão a se afastar e permitir que os investidores tentassem salvar a empresa. Ele acreditava que haviam chegado a um acordo. No dia seguinte, afirma, Mendenhall e Vaughn mudaram de posição e se ofereceram para entregar apenas o REIT. Dias depois, Thomas foi removido do conselho e perdeu o acesso às contas.

No fim de outubro, Thomas enviou uma carta aos investidores resumindo suas descobertas. Ele escreveu que o REIT estava “quebrado”, que a arrecadação de aluguéis havia caído de cerca de US$ 300 mil em janeiro para aproximadamente US$ 180 mil em setembro e que havia imóveis em execução hipotecária. Impostos e seguros não haviam sido pagos. Alguns inquilinos estavam retendo o aluguel. Fazendas haviam sido vendidas. A conta bancária mostrava um saldo de apenas US$ 2,36 milhões.

Ele também escreveu que muitos imóveis de parcerias haviam sido vendidos ou refinanciados sem aviso aos investidores. Thomas estimou que as empresas da RAD possuíam cerca de US$ 90 milhões em imóveis e ao menos US$ 90 milhões em dívidas. Diversas entidades da RAD, alertou ele, eram verdadeiras caixas-pretas, impossíveis de acessar mesmo sendo diretor.

Alguns investidores dizem que essa sensação se estendia para fora da empresa. Eles apontam as ligações da RAD com o contador Charles Dombek, que promovia estratégias tributárias em eventos da RAD. No LinkedIn, Dombek se apresenta como “especialista em financiamento de filmes” e afirma ter estruturado mais de US$ 300 milhões em empréstimos-ponte para projetos cinematográficos independentes. Ele também parece se especializar em estratégias fiscais para dentistas. Dombek diz ter trabalhado com mais de mil dentistas, reduzindo seus impostos em 30% ou mais, além de ter assessorado mais de “100 vendas bem-sucedidas de consultórios odontológicos”.

Mas, em outubro de 2024, Dombek concordou com uma liminar permanente junto ao Departamento de Justiça dos EUA. A ordem o proíbe de promover determinadas estratégias, incluindo o que o governo descreveu como entidades administrativas fictícias, transferência indevida de renda e arranjos abusivos de seguros cativos. A liminar foi emitida com seu consentimento, mas não constitui admissão de culpa. Dombek não respondeu aos pedidos de comentário.

As notícias sobre os problemas de Dombek só aprofundaram o temor dos investidores de que seu dinheiro jamais seria devolvido. Registros públicos mostram que ele registrou uma LLC (Limited Liability Company) na Flórida para o filho de Vaughn usando o endereço corporativo da RAD e o e-mail de Vaughn na empresa. Essa movimentação nos bastidores, conduzida pelo contador tributário de Vaughn, apenas aumentou a apreensão dos investidores.

Enquanto isso, a pressão aumenta sobre a RAD e seus promotores. Além da investigação do procurador-geral da Flórida em curso, o tribunal do condado de Hillsborough, onde fica a sede da RAD, já emitiu 18 sentenças à revelia contra entidades ligadas à empresa neste ano, totalizando US$ 9,5 milhões. Essas sentenças costumam ser emitidas quando os réus não respondem aos processos. Para os investidores, porém, elas têm pouco valor se não houver mais dinheiro a ser recuperado.



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