Há um sentimento no ar que os dados do Datafolha agora capturam com precisão numérica, mas que já se respirava nas ruas, nos becos, nas filas do emprego que voltou a existir: o otimismo. Não aquele otimismo vago, de autoajuda, mas um otimismo concreto, político, coletivo. Após um longo inverno de desalento, onde a palavra…
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Há um sentimento no ar que os dados do Datafolha agora capturam com precisão numérica, mas que já se respirava nas ruas, nos becos, nas filas do emprego que voltou a existir: o otimismo. Não aquele otimismo vago, de autoajuda, mas um otimismo concreto, político, coletivo. Após um longo inverno de desalento, onde a palavra de ordem era sobreviver, o brasileiro redescobre algo fundamental: a capacidade de projetar. A pesquisa mostra que 69% acreditam que 2026 será melhor para si. É o futuro deixando de ser uma ameaça para se tornar, novamente, uma promessa.
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Os anos recentes foram de desmonte sistemático não apenas de políticas públicas, mas da própria ideia de futuro compartilhado. A narrativa oficial era a da desconfiança, do cada um por si, da brutalidade como virtude e da ciência como inimiga. A esperança, naquele período, era uma espécie de resistência passiva: aguentar firme para que a gestão acabasse. Era a esperança pelo fim de algo, não pelo início. Uma esperança reativa, defensiva.
O que vemos agora, os nove pontos percentuais de crescimento no otimismo, é a transição para uma esperança ativa. E quem a conduz? Os dados são eloquentes e desmontam qualquer análise fria: o otimismo floresce com mais força entre mulheres (74%), no Nordeste (75%), entre os de menor escolaridade e renda (72% entre quem ganha até dois salários). São os setores historicamente mais vulneráveis, mais expostos ao choque da fome e do desamparo, que hoje lideram a crença na virada.
Não se engane. Isso não é acaso, nem mero efeito psicológico. É a percepção material de que o Estado deixou de ser um espectro hostil para voltar a ser um instrumento de construção, ainda que imperfeito. É ver o Auxílio Brasil virar Bolsa Família novamente, com o acréscimo do mínimo para R$ 600. É ver o Minha Casa Minha Vida renascer. É sentir o preço da cesta básica, ser encarado como uma batalha a ser travada, e não como uma sentença natural. Para quem vive no fio da navalha, a simples sensação de que alguém no comando se importa e age em sua direção é oxigênio para a alma. É a política recuperando sua função primordial: organizar a esperança.
A direita conservadora, é claro, torcerá o nariz. Dirá que é “populismo”, que é “ilusão”. Mas essa é uma visão que sempre desprezou a dimensão humana da economia. O “animal spirits” dos mercados, tão caro aos liberais, tem sua contraparte social: os “espíritos coletivos” de um povo. Uma nação desesperançada é uma nação paralisada, individualista, doente. Uma nação que ousa esperar, que volta a acreditar no amanhã, é uma nação que se move, que produz, que cria.
O fato de 60% acreditarem também num ano melhor para o país é crucial. Mostra que esse otimismo não é individualista. É um sentimento que transborda do pessoal para o coletivo, um reconhecimento de que a melhora da própria vida está atrelada a um projeto de nação. Os 59% que desaprovam o governo, mas mesmo assim esperam melhora, são talvez o dado mais filosófico de todos: revelam que mesmo na discordância, o clima geral de possibilidade contaminou até os céticos. O pessimismo deixou de ser hegemônico.
O desafio monumental deste governo será corresponder a essa expectativa gigante, em um mundo conturbado e com uma oposição feroz. Mas o primeiro passo, sem o qual nenhuma obra se inicia, já foi dado: devolver ao povo, especialmente aos mais humildes, a licença para sonhar. O otimismo, quando brota das periferias e dos bolsões de pobreza, não é ingenuidade. É o mais legítimo e potente ato político. É a semente de um Brasil que, depois de tanto se olhar no espelho com medo, finalmente se volta para o horizonte.
