O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, trocou a capital ucraniana Kiev, congelante e atormentada por mísseis, pela sala de jantar do resort de Mar-a-Lago de Donald Trump na Flórida, na esperança de conseguir a aprovação do presidente dos Estados Unidos para uma revisão do plano de paz para acabar com a guerra.
Após mais de três horas de negociações, nenhum dos dois anunciou qualquer grande avanço para acabar com o conflito iniciado pela Rússia em 2022. Ambos enfatizaram que o processo era complicado e levaria mais tempo.
Trump, que falou por telefone na manhã de domingo (28) com o presidente russo, Vladimir Putin, ainda ofereceu uma visão relativamente simpática às posições de Moscou. No entanto, ao contrário de algumas reuniões anteriores, Trump elogiou Zelensky e disse estar confiante de que a paz está próxima.
“Acho que estamos muito mais próximos, talvez muito perto”, disse o presidente dos EUA.
As equipes dos EUA, da Ucrânia e da Europa continuarão a se reunir nas próximas semanas, possivelmente em Washington, disse Trump. O presidente também deve falar novamente com Putin, que precisará assinar os termos de qualquer eventual acordo de paz.
Veja os pontos-chave da reunião entre Trump e Zelensky:
A guerra termina ou continua sem prazo para acabar
Depois de apertar a mão de Zelensky nas escadas de Mar-a-Lago, Trump insistiu que não tinha nenhum prazo em mente para acabar com a guerra na Ucrânia.
No entanto, ele também sugeriu que agora – com negociações intensas lideradas pelo enviado Steve Witkoff e pelo seu genro Jared Kushner – é o momento mais favorável em quase quatro anos para finalmente pôr fim à guerra.
“Acho que estamos nos estágios finais de negociação e veremos”, disse Trump, acrescentando: “Ou terminará ou continuará por muito tempo, e milhões de pessoas serão mortas”.
Trump tem estado frustrado com o ritmo das negociações de paz e alterna entre culpar Zelensky e Putin pela incapacidade de pôr fim ao conflito.
Depois de declarar durante a campanha de 2024 que seria capaz de resolver a guerra um dia após tomar posse, ele agora diz que é mais difícil do que imaginava – em parte porque não foi capaz de usar a relação pessoal calorosa com Putin para acabar com os combates.
A reunião de domingo, que terminou sem qualquer anúncio importante, pareceu destacar as dificuldades.
“Há uma ou duas questões muito espinhosas, questões muito difíceis, mas acho que estamos indo muito bem”, disse Trump após o encontro. “Fizemos muito progresso hoje, mas realmente fizemos isso no último mês. Este não é um acordo de um processo de um dia, é algo muito complicado.”
“É possível que isso não aconteça”, disse Trump sobre um acordo de paz. “Em algumas semanas saberemos de uma forma ou de outra.”
Putin ausente, mas não esquecido
Putin não deixou a Rússia para se reunir com os líderes em Palm Beach. Fora a viagem ao Alasca para se encontrar com Trump em agosto, ele não vai aos Estados Unidos há anos.
No entanto, sua ausência física na negociação de domingo não significa que ele ficou de fora. Trump conversou com o líder russo por mais de uma hora antes do início das negociações com Zelensky, em um telefonema que, segundo o Kremlin, foi solicitado pelo presidente dos EUA. Trump também disse que falaria novamente com Putin após seu encontro com o líder ucraniano.
É um padrão que preocupa os apoiadores da Ucrânia: antes do encontro com Zelensky, Trump ouve o ponto de vista de Putin e a reunião com o líder ucraniano termina mal.
Essa sequência ocorreu em outubro, quando – após uma ligação com Putin – Trump se recusou a fornecer novos mísseis de longo alcance à Ucrânia, apesar de ter demonstrado estar aberto à ideia anteriormente.
Desta vez, a conversa de Trump com Putin não impediu um encontro positivo com Zelensky. Mas o presidente dos EUA ainda elogiou Putin em um aspecto: a forma como gerenciou a usina nuclear de Zaporizhzhia, um ponto de desavença fundamental nas negociações.
“O presidente Putin está na verdade trabalhando com a Ucrânia para abrir (a usina)”, disse Trump. “É um grande passo, quando ele não está bombardeando aquela planta.”
Trump disse que ainda acha que Putin leva a paz a sério. “Ele quer ver isso acontecer. Ele quer ver”, disse ele. “Ele me disse com muita veemência, eu acredito nele.”
Os últimos 10%
A caminho da reunião, Zelensky disse que 90% dos termos do plano de paz foram acordados, reforçando um número usado pelas autoridades americanas. Em seguida, Zelensky repetiu o mesmo número, embora Trump tenha dito que não gosta de usar percentagens.
Ainda assim, são os 10% restantes que se revelaram tão difíceis de resolver. Os principais pontos de discórdia incluem o destino da usina nuclear de Zaporizhzhia e as questões da concessão de terras.
Trump sugeriu que é melhor abrir mão de territórios agora, antes que a Rússia invada ainda mais.
“Algumas dessas terras foram tomadas. Algumas dessas terras talvez estejam sendo disputadas, mas podem ser tomadas nos próximos meses”, disse ele. “É melhor fazer um acordo agora?”
Zelensky tem demonstrado flexibilidade, dizendo que está disposto a submeter qualquer acordo de paz a um referendo (a constituição da Ucrânia exige que quaisquer alterações às suas fronteiras nacionais sejam submetidas a uma votação). No entanto, disse que seria necessário garantir um cessar-fogo para realizar o referendo.
A Rússia, que lançou uma nova série de ataques com mísseis e drones contra a Ucrânia antes do encontro de domingo, recusou qualquer conversa sobre cessar-fogo.
E durante a ligação de Trump com Putin, os dois líderes expressaram que “geralmente compartilham opiniões semelhantes” de que uma trégua temporária apenas prolongará o conflito na Ucrânia, segundo o assessor do Kremlin, Yuri Ushakov.
Ele acrescentou que “dada a situação nas linhas de frente”, a Ucrânia deverá decidir em breve o que fazer com a região de Donbass, o principal território cobiçado por Putin.
Trump disse após a reunião com Zelensky que “estamos cada vez mais perto de um acordo” sobre o destino de Donbass, que, segundo ele, é “uma das grandes questões”.
Um relacionamento complicado
Desde a desastrosa reunião em fevereiro, cada encontro entre Trump e Zelensky durante o segundo mandato do presidente dos EUA foi observada de perto. Nenhuma das reuniões seguintes atingiram o mesmo nível de confronto, embora alguns encontros a portas fechadas tenham sido descritos como difíceis.
Ao cumprimentar Zelensky em sua propriedade em Palm Beach, Trump rasgou elogios: “Este cavalheiro trabalhou muito e é muito corajoso, e o seu povo é muito corajoso”, disse ele.
Zelensky abriu e concluiu sua fala agradecendo a Trump,. Na reunião de fevereiro, Trump e o vice-presidente dos EUA, JD Vance, o repreenderam pela ingratidão aos líderes americanos pelo seu papel na mediação.
Trump usou Mar-a-Lago no passado para cultivar relações mais pessoais com os seus homólogos globais, incluindo o líder chinês Xi Jinping e o falecido primeiro-ministro japonês Shinzo Abe.
Zelensky foi a Palm Beach porque Trump está passando as férias em Mar-a-Lago – um cenário menos formal do que o Salão Oval ou a Sala de Gabinete da Casa Branca.
“Ele entrou e disse: ‘Este lugar é lindo’”, afirmou Trump sobre Zelensky no final da reunião. “Acho que ele não quer mais ir para a Casa Branca.”
