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Protestos crescem na Bolívia contra aumento de até 160% no preço de combustíveis decretado por Rodrigo Paz

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As mobilizações na Bolívia contra o Decreto Supremo 5503, assinado pelo presidente Rodrigo Paz, entraram em seu nono dia com a adesão de novos setores e o reforço das manifestações na capital e em outras regiões do país, nesta terça-feira (30). A medida, que elimina subsídios aos combustíveis e facilita a exploração de recursos naturais do país por empresas privadas, é alvo de duras críticas por parte de sindicatos e movimentos populares.

Desde o início das manifestações, no dia 22 de dezembro, a Central Operária Boliviana (COB), principal entidade sindical do país, vem liderando protestos diários em La Paz, mesmo durante o período de festas. A organização anunciou que a paralisação será por tempo indeterminado e que pretende transformar a mobilização em uma campanha nacional de informação sobre os impactos do decreto, que tem 121 artigos e afeta diversos setores estratégicos da economia.

Além de extinguir o subsídio aos hidrocarbonetos, elevando o preço da gasolina em 86% e do diesel em 160%, o governo autorizou, no último dia 27, o aumento das tarifas do transporte público. A decisão deu novo impulso aos protestos, que passaram a ocupar também a sede do Legislativo e as imediações do Palácio do Governo.

Segundo a COB, o decreto transfere o custo do ajuste fiscal aos setores populares, agrava a inflação e compromete a soberania nacional. As lideranças sindicais denunciam que a norma favorece empresas transnacionais, grandes empresários e o agronegócio, ao passo que retira do Estado instrumentos de controle e planejamento sobre os bens comuns. A organização alerta ainda para a possibilidade de entrega do setor do lítio, considerado estratégico e atualmente disputado por corporações internacionais.

Pacto sindical e histórica capacidade de resistência

Na última semana, a COB anunciou um pacto de unidade com organizações camponesas, trabalhadores urbanos e professores rurais, ampliando o alcance e a força das mobilizações. Até mesmo a Confederação dos Médicos aderiu às manifestações. Os protestos passaram a incluir greves de fome, ocupações de estradas e novos piquetes em locais simbólicos, como a Casa Social do Mestre e a sede da Federação de Mineiros.

O secretário executivo da COB, Mario Argollo, afirmou que as mobilizações continuarão até que o decreto seja revogado. Segundo ele, a medida “rifa e vende o país”, além de intensificar o desabastecimento, o desemprego e a perda do poder de compra. Ele também apontou que qualquer eventual diálogo com o governo só será considerado se houver compromisso com a verdade e participação das bases.

“Vamos consultar nossas bases, porque assim nos organizamos. Somos apenas porta-vozes das nossas organizações sociais, que neste momento estão mobilizadas”, afirmou Argollo.

A COB também declarou que os protestos podem se intensificar caso alguma empresa estrangeira inicie operações com base no novo decreto. O receio é que a medida abra caminho para a desnacionalização dos recursos naturais, revertendo políticas de soberania que marcaram governos anteriores.

O presidente Rodrigo Paz, que assumiu o cargo em novembro, em meio à fragmentação das forças progressistas do país, vinha se apresentando como alternativa de centro. Mas, segundo organizações populares, suas primeiras medidas apontam para a adoção de um programa liberal com alinhamento aos interesses dos Estados Unidos. Além disso, setores da esquerda denunciam uma tentativa de apagar a presença indígena da gestão do Estado Plurinacional.

O ex-presidente Evo Morales criticou publicamente a decisão do governo, chamando-a de improvisada e socialmente injusta. Segundo ele, os aumentos dos combustíveis rompem qualquer critério de equilíbrio entre o custo de vida e os salários da população.

“Enquanto o salário mínimo cresceu cerca de 20%, a gasolina subiu 86% e o diesel, 160%. Essa brecha golpeia com mais força as famílias trabalhadoras”, afirmou. Para Morales, sem estudos técnicos, sem medidas de proteção e sem consenso popular, o fim dos subsídios se transforma “em um castigo social, e não em uma solução estrutural”.

Apesar da repressão policial às manifestações, os dirigentes da COB afirmam que a mobilização nacional será mantida e reforçada nos primeiros dias de janeiro. Eles lembram que o povo boliviano tem uma longa tradição de resistência popular, como nas lutas que impediram a privatização da água, na chamada Guerra da Água, e que derrubaram presidentes, como ocorreu durante a Guerra do Gás.

O decreto

O Decreto Supremo 5503, publicado no dia 17 de dezembro, foi editado pelo governo boliviano sob a justificativa de uma “emergência econômica, financeira, energética e social” e reúne um pacote amplo que vai além do reajuste dos combustíveis.

O texto fixa, por seis meses, novos valores para combustíveis, como a gasolina especial (6,96 bolivianos por litro) e o diesel (9,80 bolivianos por litro), e afirma que a política de subsídios era “insustentável”, por supostamente incentivar o contrabando e a corrupção.

Também cria um regime extraordinário de promoção e “proteção” de investimentos com promessa de estabilidade jurídica e tributária por até 15 anos, institui um trâmite acelerado (que o documento chama de “fast track”) para projetos considerados estratégicos e abre caminho para mecanismos de regularização e repatriação de capitais. O decreto também flexibiliza regras para importações e exportações, com foco em setores como o agroindustrial.

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