Um ataque deixou um indígena Guarani Kaiowá morto com um tiro na testa, e outros quatro feridos, na Terra Indígena (TI) Iguatemipeguá I, em Iguatemi, Mato Grosso do Sul, na madrugada deste domingo. O caso foi confirmado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
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De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), por volta das 4h, cerca de 20 homens fortemente armados atacaram a retomada de Pyelito Kue pela posse do território, que foi identificado e delimitado como terra indígena pela Funai em 2013, mas está com a sua demarcação paralisada desde então.
O ataque durou até as 6h, e Vicente Fernandes Vilhalva Kaiowá e Guarani, de 36 anos, foi morto com um tiro na cabeça. Segundo relatos ouvidos pelo Cimi, os atiradores tentaram recolher o corpo para levá-lo, mas foram impedidos pelos próprios indígenas.
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Outros quatro ficaram feridos, entre eles dois adolescentes e uma mulher, que foram atingidos por disparos nos braços e no abdômen. Um adolescente levou também um tiro de arma de fogo, enquanto os demais foram alvejados com balas de borracha.
Em nota, a Assembleia Geral do povo Kaiowá e Guarani (Aty Guasu), organização regional da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), disse que a retomada sofre ataques desde a semana passada, mas que esse foi o mais brutal. O grupo afirmou que não aceitará mais que sejam tratados “como invasores em nossas próprias terras”. “A Constituição Federal garante nossos direitos, e o Estado brasileiro tem o dever de proteger nossos povos”, disse.
Já a Funai manifestou “profundo pesar” pela morte de Vicente “após ataques de pistoleiros, em contexto de recente retomada realizada nos dias anteriores”.
Segundo a fundação, uma equipe atua junto ao Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas no caso e acionou os órgãos de Segurança Pública responsáveis após a denúncia. A Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) chegou ao local ainda pela manhã.
“A Funai reforça a necessidade de uma investigação rigorosa e uma ação conjunta para combater os grupos de pistoleiros que atuam na região. Ressalta, ainda, a importância de políticas que fortaleçam a proteção dos indígenas e de seus territórios”, continua em nota, destacando que um Grupo de Trabalho Técnico (GTT) foi montado com foco na mediação dos conflitos no Mato Grosso do Sul.
“É inaceitável que indígenas continuem perdendo suas vidas por defender seus territórios. A morte de mais um indígena Guarani Kaiowá acontece ao mesmo tempo em que o mundo discute e visualiza a importância dos povos indígenas para a mitigação climática debatida na COP30, infelizmente evidenciando que não existe trégua na perseguição aos corpos dos defensores do clima”, finaliza.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) disse que, quando as equipes da FNSP chegaram ao local, foram identificadas três vítimas, sendo duas feridas e um óbito. “As providências de socorro foram adotadas, e a Força Nacional reforçou o patrulhamento na região, em apoio às ações da PF e da Funai”, afirmou em nota.
O GLOBO procurou a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública do Mato Grosso do Sul, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem.
No começo do último mês de outubro, o povo Guarani Kaiowá retomou uma área da Fazenda Cachoeira, sobreposta à TI Iguatemipeguá I e colada à aldeia de Pyelito Kue. Desde então, sofreram quatro ataques, sendo o deste domingo o mais brutal.
Após o ataque, os Guarani Kaiowá recuaram para a aldeia e registraram os disparos. Os pistoleiros obstruíram, então, os acessos ao local, incluído por meio da destruição de uma ponte, o que atrasou a chegada da FNSP após os indígenas terem acionado a Funai.
— Os pistoleiros tomaram a ponte e fizeram um cerco. Estamos cercados. Estão atirando. Seguiram atirando até aqui na aldeia, fora da retomada, nas nossas casas. Estamos cercados. Sem chance de defesa — disse uma indígena Guarani Kaiowá, que não identificada por razão de segurança, durante o ataque às autoridades, de acordo com o Cimi.
