Eleitores chilenos elegeram José Antonio Kast no segundo turno das eleições presidenciais do país neste domingo (14) sobre a candidata da esquerda, Jeannette Jara. Com o resultado, o Chile será comandado pela extrema direita pela primeira vez desde o final da ditadura de Augusto Pinochet (1973-90).
Por volta das 18h, o Serviço Eleitoral do Chile (Servel) decretou oficialmente o fechamento das urnas neste domingo (14), encerrando a jornada de votação do segundo turno presidencial no Chile. Quinze milhões de chilenos estavam aptos a votar.
Diferentemente do primeiro turno, o voto é obrigatório para todos os eleitores registrados, com multas que podem variam de 34 mil pesos (cerca de 200 reais) a 104 mil pesos chilenos (cerca de 600 reais) em caso de reincidência.
No primeiro turno, realizado em 16 de novembro, Jara havia vencido, porém com menos votos do que o previsto (26,8%) e Kast ficado em segundo lugar, mas com melhor fatia do eleitorado (23,9%) que as pesquisas indicavam.
A disputa
Com a vitória de Kast, apelidado de “Bolsonaro chileno”, a extrema direita volta ao poder no Chile pela primeira vez desde o final da longa ditadura do general Pinochet em 1990, regime sangrento que já foi defendido pelo presidente eleito. Marcado pela repressão brutal e graves violações dos direitos humanos, o regime Pinochet legou aos chilenos a atual Constituição, apesar de duas propostas de reforma terem sido rejeitadas em referendos recentes.
Este pleito foi marcado pela ênfase no tema imigração. O Chile se tornou um destino importante para imigrantes, principalmente da Venezuela, dobrando a população estrangeira em sete anos (8,8% do total em 2024). Cerca de 337 mil imigrantes vivem em situação irregular, e a maioria dos chilenos associa o aumento da criminalidade à imigração, associação que foi aproveitada politicamente.
Ao encerrar a campanha eleitoral na quinta-feira (11), Kast prometeu “um choque de esperança” após anos de “caos, desordem e insegurança”. Sobre um palanque cercado por vidro blindado, Kast fez seu último discurso de campanha para cerca de cinco mil apoiadores reunidos em uma praça de Temuco, capital da região de Araucanía, cerca de 800 km ao sul de Santiago.
“Este governo gerou caos, desordem e insegurança. E nós vamos fazer o contrário: vamos gerar ordem, segurança e confiança”, afirmou Kast sobre o palco, ao lado dos colaboradores mais próximos de sua campanha. Esta é a terceira vez que o advogado de 59 anos concorre à presidência.
“A extrema direita volta ao poder no Chile, bem mais radicalizada do que Sebastián Piñera [que governou o país entre 2010-14 e 2018-22], mas extremamente pinochista, que reivindica um passado glorioso que teria ocorrido durante a ditadura [1973 – 1990]”, disse ao Brasil de Fato o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC) Gilberto Maringoni.
Contexto político
A sucessão do atual presidente Gabriel Boric foi uma espécie de tira-teima entre a direita e a esquerda no Chile, que travam uma forte disputa pelo comando político do país desde 2019. O Chile ainda vive consequências da revolta social de outubro daquele ano, conhecida como Estallido, que tomou as ruas e foi respondida com repressão estatal, com um saldo de 32 manifestantes mortos e 3,4 mil feridos.
De viés esquerdista e exigindo reformas sociais em um primeiro momento, os protestos foram capitalizados pela direita chilena, que conseguiu conduzir ao sentimento de desconfiança e frustração, apresentando-se como defensora da ordem e da segurança.
Vencedor do pleito após Estallido, o presidente de esquerda, Gabriel Boric, tentou logo em seu primeiro ano de governo emplacar uma reforma constitucional para aposentar a carta anterior, que remonta dos tempos da ditadura Pinochet (1973 – 89). O plebiscito, no entanto, rejeitou a proposta, que trazia direitos sociais amplos e proteções ambientais significativas, por ser muito progressista.
“Creio que a esquerda superestimou sua força e perdeu o momento favorável pós Estallido”, disse ao Brasil de Fato José Maurício Domingues, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos e analista político da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).
Ele diz achar que à época do primeiro plebiscito, “a esquerda não se deu conta de que o voto obrigatório [na consulta de 22] traria para o jogo um eleitorado que não havia votado por Boric. Uma coisa são as ruas, outra o sistema político formal.”
“Mas a direita também se equivocou”, prossegue Domingues, se referindo à outra proposta de Constituição, mais reacionária ainda que a vigente, que também foi rejeitada no ano de 2023.
“De certa forma essa eleição é um tira-teima, mas não em sentido absoluto. O controle do congresso vai ser muito importante também.”
*Com informações do Opera Mundi e AFP.
