O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, tem apresentado a ministros da Corte a intenção de criar um código de conduta para integrantes do STF e de tribunais superiores, a exemplo de outros países. Embora a questão esteja ainda em debate, seria uma decisão sensata para proteger a ética do mais relevante serviço público — a Justiça —, além da imagem dos tribunais e de seus integrantes.
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A proposta de Fachin é inspirada no Código de Conduta do Tribunal Constitucional da Alemanha, adotado em 2017 num ambiente de pressão política por transparência. Pelo código alemão, há regras para aceitação de presentes ou benefícios de ordem pessoal e para dirimir conflitos de interesse. Juízes podem aceitar remuneração por palestras, participação em eventos e publicações, mas desde que isso não comprometa a reputação do tribunal nem gere dúvida em relação a independência, imparcialidade e integridade. Presentes ou benefícios podem ser recebidos dentro de limites financeiros e em contextos sociais, mas apenas se não puserem em questão o comportamento dos magistrados.
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No Brasil, ainda que não constitua ilegalidade do ponto de vista jurídico, a participação de ministros em palestras e eventos patrocinados tem sido questionada com frequência. No ano passado, os ministros do STF Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes participaram em Londres de evento patrocinado pelo Banco Master, depois alvo da operação que deteve o banqueiro Daniel Vorcaro. Nos últimos dias, veio à tona a viagem de Toffoli a Lima, no Peru, para assistir à final da Libertadores no avião do empresário Luiz Oswaldo Pastore, como revelou o colunista do GLOBO Lauro Jardim. No mesmo voo, estava Augusto Arruda Botelho, advogado de Luiz Antônio Bull, diretor do Master também preso. Dias depois, Toffoli, relator do caso Master, pôs em sigilo o processo. Mesmo que tudo possa ser coincidência— Toffoli só foi sorteado relator horas antes da viagem a Lima—, é inevitável o dano à imagem do Supremo. Não faltam exemplos de viagens custeadas por empresários, por vezes, com demandas na Corte. Daí a pertinência da preocupação de Fachin.
Não só no Brasil a conduta de magistrados desperta questionamentos. Nos Estados Unidos, a agência ProPublica revelou viagens luxuosas, presentes e benefícios recebidos por magistrados da Suprema Corte, sem qualquer transparência, de empresários com interesses no tribunal. No escândalo de maior repercussão, o empresário Harlan Crow comprou imóveis do juiz Clarence Thomas e familiares, além de bancar estudos de um filho dele numa escola privada. Depois da reportagem, vencedora do prêmio Pulitzer, o tribunal decidiu criar um código de conduta para os juízes.
A relevância conquistada e o poder concentrado pelos ministros do Supremo nos últimos anos tornam prioritária a criação de um código de conduta que balize a atuação de juízes fora dos tribunais. É desejável que a ideia de Fachin, por enquanto restrita aos círculos internos, vá adiante. De ministros que tomam decisões de tamanha importância para o país não se esperam apenas ética, discrição e atitudes que não deem margem a questionamento, mas eles têm de ser assim percebidos. Sobre a mais alta Corte do país — aquela que tem o proverbial direito de “errar por último” —, não podem pairar dúvidas.
