Estamos em 2025. Ano que vem tem eleição presidencial. E este é o último Ponto de Partida do ano. Sabe, estamos juntos aqui faz algum tempo, já. Acho que temos proximidade o suficiente para que eu possa fazer um pedido a todos vocês. A cada um. Seja, você, quem traz paz para a Ceia. Não importa se a festa de família é o Chanuká, o Natal ou o Ano Novo. Não brigue. E, ainda assim, converse sobre política. Não deixe de conversar sobre política.
A minha proposta é quase um jogo. Quando todo mundo estiver sentado à mesa, faça o seguinte: proíba que se mencione nomes de políticos, de partidos. Estão proibidas palavras como liberalismo, socialismo ou conservadorismo. Não pode falar em esquerda ou direita. Então como vamos falar de política? É muito simples. Nós vamos fazer para cada pessoa quatro perguntas. Cada um responderá como se posiciona a respeito destes quatro eixos.
A primeira pergunta: Quando você pensa em saúde, educação, aposentadoria e quem perde o emprego, qual deve ser a responsabilidade do Estado?
A resposta para todas as perguntas não é absoluta. É uma régua com muitos tons de cinza entre preto e branco e quase ninguém cai no preto absoluto ou no branco absoluto. Mas, aqui, a discussão é sobre o Estado de bem-estar social. O quanto o Estado deve entregar ou não para cada cidadão. Uma conversa sobre um bolsa família, por exemplo, entra aqui. Qual é o colchão de apoio que todos devemos ter?
Aí vem a seguinte pergunta: Na economia (indústria, agro, serviços, tecnologia), que papel o governo deveria ter na escolha de quais setores crescem e sobrevivem?
Vamos lá. Quantos setores deveriam ser estatais? Energia tem de ser o governo que controla, ou mineração, ou aviação. Tem algo que é arriscado demais não ser controlado pelo Estado? Mas mesmo que não estejamos falando de estatais. Cabe ao governo definir, olhando para todo o país, que setores devem crescer mais ou menos? Aí dá isenção de imposto, empréstimos facilitados e tudo o mais? Ou será que o Estado não deveria se meter muito nisso e deixar a sociedade encontrar seus caminhos? A criatividade que existe na sociedade vai fazer nascer coisas novas e interessantes onde ninguém imagina?
Duas de quatro perguntas. Nosso objetivo, aqui, qual é? Ouvir. Percebe que estamos tirando todas as questões que causam ruído imediato e estamos começando a falar sobre valores. Sobre como deveria funcionar um país. Nestas duas perguntas aqui estamos falando de economia. Mais bem-estar social, mais imposto. Estado mais definidor dos destinos econômicos, mais imposto. A alternativa é menos imposto, mas aí também tem de pagar escola dos filhos, depender de seguro de saúde, tem de prever sozinho a aposentadoria. Torcer para nunca precisar. Ou, no caso da política industrial, tem de apostar que a sociedade sozinha pode explodir, criar, crescer, sem que um grupo de técnicos construa estes caminhos.
Estas duas respostas não apontam necessariamente para direita ou esquerda. Ernesto Geisel e Dilma Rousseff, juntos, acreditam num Estado que guie a política industrial. Com ambos estaria junto e feliz Juscelino Kubitschek. Foi o movimento liberal britânico, e vários governos liberais em Londres, que criaram o ensino público universal no Reino Unido ainda no século 19. Foi um sujeito profundamente conservador, e bastante autoritário, o chanceler Otto von Bismarck, que criou o Estado de bem-estar social alemão. Ao mesmo tempo em que a China comunista tem um dos Estados de bem-estar mais frágeis do mundo.
Só com essas duas perguntas, aposto que já vai dar confusão. Vai ter gente da família que votou em Lula e gente da família que votou em Bolsonaro se colocando no mesmo lado em uma, se bobear duas, das respostas. Aliás,. Não é que vai dar em confusão. Vai dar em surpresas, em elucidação. Porque vocês já devem ter entendido o objetivo desse jogo, né? É descobrir que país queremos para além do comunista de um lado, fascista do outro.
E, sim, no final eu vou dizer para vocês como é que eu me coloco em cada uma das quatro perguntas. Mas isso é depois. Ainda faltam duas. Falta a gente falar sobre costumes e a gente falar sobre regime. Vem comigo pra depois da vinheta.
Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.
Olha, vamos passar o ano de 2026 tentando entender cenário. Esta é a terceira eleição presidencial do Meio. Crescemos um bocado desde a primeira e viemos, cada vez mais, nos especializando em explicar para as pessoas cenário. Explicar no que cada um tem de prestar atenção para entender o que acontece. Bem, estava na hora de termos nossa próxima pesquisa. Você recebe PDF de pesquisas eleitorais enquanto o pleito está rolando? Tem sempre aquele amigo, aquele conhecido mais enturmado que tem esses arquivos e manda, não é? Gente que trabalha em banco, jornalista, pessoal de política, mesmo. Em 2026, você pode ser uma dessas pessoas. Basta ser assinante do Meio Premium. 15 reais por mês ou 150 por ano. No segundo em que o TSE liberar nossa pesquisa mensal, você estará na lista das pessoas que receberão primeiro a Pesquisa Meio-Ideia. Todo mês. Você será, no grupo de amigos, quem está no topo da informação. E não são só os números. Vai ter análise também da pesquisa, o que aqueles números querem dizer. Feitas pelo Maurício Moura, diretor do Ideia, feitas por mim. Uma pesquisa própria nos permite entender não só quem está na frente, quem está atrás, mas principalmente escolher que perguntas fazer para tentar descobrir o que está movendo as pessoas. A gente vai trazer luz para perguntas que as pesquisas não fazem, hoje. Basta assinar o Meio. Já começa agora, na virada do mês. Assine já. Seja a pessoa que traz informação para as conversas de política ao seu redor. Ajude a disseminar informação de qualidade.
E este aqui? Este é o Ponto de Partida.
Em temas de família, religião, sexualidade, drogas, modo de se vestir e de falar: que papel o governo deveria ter?
Esta pergunta é de uma preciosidade, sabe? Aqui a questão não é se meninas trans podem frequentar o banheiro feminino na escola, não é se aborto deve ser legal. Não é se deve haver crucifixo em tribunal. Os exemplos muito específicos são sempre uma armadilha. A questão aqui é a seguinte. Tipo, na boa: tem de ter lei sobre essas coisas? E qual é o limite? Tem de ter uma lei dizendo que tipo de família deve existir? Um homem gay deve ter menos direitos que um heterossexual? Os templos de uma religião podem ter vantagens que os de outra? Aliás, uma religião deve ser privilegiada em relação a outra? A gente deve controlar o que adultos podem consumir?
No fim das contas, o que está em debate nessa pergunta é o seguinte: o que um ser humano adulto pode escolher por si e o que deve ser controlado pela coletividade. Pela sociedade. Veja, todos concordamos que certos comportamentos são intoleráveis para a vida em comunidade. Estupro, homicídio, certos limites contam com ampla concordância. No fundo, a provocação é mesmo de limites. O que faz de uma comunidade segura para se viver? Uns acham que certos comportamentos são uma ameaça ao coletivo e devem ser controlados. Outros acham que aí bate numa questão essencial de liberdade individual. O comportamento do fulano vai me incomodar? Possivelmente. Mas eu não tenho o direito de interferir nas escolhas dele. Só que… Só que espera aí: e se o comportamento da pessoa é uma influência sobre seus filhos? Gente, são camadas e camadas e camadas.
Esta pergunta separa liberais de conservadores. Talvez não seja surpresa para vocês mas metade dos eleitores de esquerda, no Brasil, se alinham com os conservadores neste eixo.
Quarta e última pergunta. Quando um governante muito popular entra em conflito com tribunais, órgãos de controle, imprensa ou Parlamento, de que lado você tende a ficar?
Veja. Ele foi eleito. É um governante muito popular, mais de metade do país gosta da pessoa. Mas não faça essa pergunta dependendo de lado. A quem votou em Lula, pergunte para a pessoa imaginar Lula neste lugar. A quem preferiu Bolsonaro, peça que pense nele nesta exata situação.
Quem está na presidência da República deve prevalecer pois foi eleito e tem apoio do povo? Ora, uma democracia não é justamente isso, a voz do povo? Ou não? De repente é um meio termo. Quem está na presidência, em momentos excepcionais, aí pode se sobrepor. Afinal, trata-se de uma crise, ou uma grande oportunidade. A alternativa é, de forma alguma. Os órgãos de controle existem lá para botar limite para quem precisa de limite, caramba. É quando alguém está confortável demais no comando que o risco de uma tirania aparece. Poder tem de ter limite sempre, não importa o ocupante.
Quatro perguntas. Estão todas aqui, na descrição deste vídeo, por escrito. Ouça as respostas. Ouça com atenção. Você vai descobrir que há muitos pontos de concordância por trás das etiquetas direita e esquerda. Haverá discordância, também, mas há um espaço imenso de consenso. E em cima daquilo com o qual concordamos que acordos podem ser feitos, que a mútua humanidade é reconhecida. Mútua humanidade, gente. Estamos juntos nesse barco.
E eu? Eu acho que quanto mais quem for presidente tiver popularidade, maior o controle externo necessário. Sou igualmente radical a respeito de família, religião, sexualidade, drogas, modo de se vestir e de falar. Pertence à esfera individual. As pessoas são quem são, desejam, amam, escolhem, cabe a nós respeitarmos e cobrarmos respeito. Não acho que o Estado tenha de se meter muito na política industrial. Regulação, sim. Mas minha leitura da história é de que os grandes sucessos nascem de sociedades que têm amplo espaço para criar sem dirigismo estatal. E, por fim, de novo pela leitura que faço da história, acredito que um Estado de bem-estar social é necessário. É preciso haver educação e saúde públicas universais em alguma medida, programas para garantir que ninguém passe fome ou fique sem teto, e, sim, algum tipo de aposentadoria pública. Não dá para ter uma previdência que pague grandes salários, mas uma base acho importante haver.
O que este desenho faz de mim? Um liberal social, ou liberal progressista. Certamente alguém com uma cabeça Ocidental, e não Oriental. Fruto do mundo em que fui criado. Todos nós somos.
Chag sameach, feliz Natal, próspero ano novo. A gente volta a se encontrar em janeiro.
