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Conheça o Bilionário por trás da Tricon Energy, Gigante Global do Setor de Energia Privada

by admin

JAMEL TOPPIN PARA FORBES

Cochilos aumentam a produtividade, afirma Ignacio Torras, em sua casa em Houston

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Ignacio Torras tira um cochilo todas as tardes. Nos dias em que o fundador e CEO da trader de commodities Tricon Energy trabalha em sua sede em um arranha-céu de Houston, ele dorme em sua poltrona branca de couro, no canto de seu escritório cercado por paredes de vidro.

Aos 61 anos, Torras não se importa com o fato de que os traders responsáveis por grande parte dos US$ 13 bilhões (R$ 71,63 bilhões) em receitas anuais da Tricon possam observá-lo dormir. O cochilo não precisa ser longo. “Apenas o suficiente para limpar a mente”, diz ele.

Essa é a chave para conseguir equilibrar tantas atividades ao mesmo tempo. Isso inclui desde acompanhar seus dois restaurantes espanhóis em Houston (entre eles o BCN Taste & Tradition, com estrela Michelin) até ir à missa com a esposa, Isabel, pelo menos algumas vezes por semana, além de organizar partidas de futebol quinzenais no campo localizado no quintal de casa em estilo espanhol.

Naturalmente, grande parte do seu tempo é dedicada à Tricon, sua empresa que faturou US$ 13 bilhões em 2024 (R$ 71,63 bilhões) e que estreou na 35ª posição do ranking da Forbes das 200 maiores empresas privadas dos Estados Unidos.

Negócio bilionário

A Tricon movimenta 24 milhões de toneladas de produtos químicos por ano ao redor do mundo. São, em sua maioria, commodities como polipropileno, usado na fabricação de chapas plásticas, além de xileno e metanol, ingredientes essenciais para garrafas plásticas e tecidos de poliéster.

Seu produto mais vendido são pellets de resina de polietileno — pequenos grânulos de plástico que a Tricon compra de empresas como ExxonMobil ou Dow Chemical e revende a fabricantes que irão derretê-los e remodelá-los em brinquedos, tampas de garrafa e peças automotivas.

Diferentemente de fundos de hedge ou traders puramente financeiros, a Tricon assume a posse física dos produtos.

“Assumimos 100% da titularidade. Compramos 5 mil toneladas, levamos para um armazém em Houston e vendemos 300 toneladas para a Argélia, 500 toneladas para a Nigéria”, explica Torras. “Somos o Walmart dos produtos químicos.”

Desafios para a Tricon Energy?

Talvez. Como muitas empresas globais, a Tricon está sendo impactada pelas guerras tarifárias de Donald Trump. Ainda mais grave é o efeito pós-pandemia: durante a Covid, a demanda por produtos químicos disparou e os preços subiram, levando a uma expansão massiva de plantas químicas financiadas com juros extremamente baixos.

A Shell gastou US$ 14 bilhões (R$ 77,14 bilhões) em um megacomplexo inaugurado na Pensilvânia em 2022, enquanto a China concluiu meia dúzia de megaprojetos químicos nos últimos anos, incluindo o complexo de US$ 10 bilhões (R$ 55,1 bilhões) da ExxonMobil em Huizhou.

Em pouco tempo, surgiu um excesso de oferta que desencadeou uma série de consequências. Em julho, a Dow Chemical cortou seu dividendo em 50%. A Lyondell baixou em US$ 1 bilhão (R$ 5,51 bilhões) o valor de seus ativos químicos na Europa no último trimestre. Na Coreia do Sul, Lotte e Hyundai anunciaram em novembro que iriam consolidar a produção de plásticos de polietileno e desativar fábricas excedentes. A Shell informou que busca vender parte de seu novo megacomplexo.

Enquanto isso, as ações de grandes fabricantes como Dow Chemical, LyondellBasell e Westlake acumulam queda de 40% no ano. “É uma situação de mercado muito ruim”, diz Torras, que descreve o momento como o pior para a indústria química em 20 anos.

Mesmo assim, em termos de volume e participação de mercado, este será o melhor ano da história da Tricon. Os lucros não serão tão elevados quanto no pico de 2022 (antes da virada do ciclo), afirma Torras, mas, impulsionada por uma sequência de aquisições, a empresa está embarcando 20% mais produtos químicos do que há um ano e espera que as receitas cresçam na mesma proporção.

A Forbes estima que a Tricon tenha um valor empresarial superior a US$ 5 bilhões (R$ 27,55 bilhões), o que torna Torras — dono de 90% do capital — um bilionário. Ele dá de ombros e diz que nunca mandou avaliar a empresa, e que não o faria, especialmente agora.

Além disso, está ocupado enfrentando a fase de baixa para comemorar. “O dia segue a noite”, costuma lembrar a si mesmo. “Prepare-se para a virada do ciclo, porque ela virá, como sempre vem.”

Como tudo começou

Torras aprendeu a lidar com altos e baixos desde cedo. Ao crescer em Barcelona, na Espanha, sua família já era rica, tendo acumulado uma pequena fortuna com fábricas de papel e jornais. Tudo foi perdido, segundo ele, na recessão dos anos 1970.

Em 1982, aos 18 anos, Torras imigrou com a família para São Paulo em busca de uma nova vida. Nacho, como é chamado, estudou na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Enquanto isso, seu pai usou contatos antigos e começou a negociar produtos químicos para a indústria papeleira, como soda cáustica (hidróxido de sódio, utilizada para amaciar e branquear fibras de madeira), vendendo principalmente para fabricantes chineses.

Apenas quatro anos depois, seu pai foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica (ELA), conhecida como doença de Lou Gehrig, e faleceu em 1988. Torras, então com 22 anos, assumiu o negócio, viajou para visitar clientes existentes e conquistar novos, aprendendo no processo que “ganhar um dólar exige muito trabalho.”

Mas nem mesmo o esforço intenso foi suficiente. A retração econômica temporária da China nos meses seguintes ao massacre da Praça da Paz Celestial, em 1989, reduziu a demanda do que havia se tornado o principal mercado de Torras.

Incapaz de sustentar a operação sozinho, aos 25 anos ele encerrou o pequeno negócio e conseguiu um emprego na Holland Chemical, em Houston, ganhando US$ 30 mil por ano (R$ 165.300; cerca de US$ 75 mil hoje, R$ 413.250).

Não demorou para chamar atenção. “Um dia encontrei um bilhete no meu carro dizendo que aquele não era um carro à altura do melhor trader da empresa”, conta, rindo ao lembrar que se tratava de um Hyundai. Ele permaneceu sete anos na Holland Chemical, posteriormente adquirida pela Brenntag, hoje a maior trader de produtos químicos do mundo.

Junto com outros três traders, acumulou dinheiro para lançar a Tricon. Sua mãe, de volta à Espanha, recusou-se a fornecer capital inicial. Então ele a convenceu a emprestar US$ 87 mil (R$ 479.370; US$ 185 mil hoje, R$ 1.019.350), garantidos pela parte do apartamento de sua avó em Barcelona que ele herdaria após a morte dela. “Uma meta de cada ano sempre foi não precisar voltar para pedir mais dinheiro à minha mãe”, brinca.

Finalmente o sucesso

A conquista veio ao nadar contra a corrente. Após a crise financeira asiática do fim dos anos 1990, Torras encontrou novos fornecedores de produtos químicos dispostos a negociar, como as sul-coreanas Lotte e Hanwha. A Tricon abriu um escritório em Seul, seguido por Xangai e Istambul. Em 2007, Torras entrou no segmento de distribuição de plásticos. Em 2015, com a queda dos preços do petróleo, a empresa passou a negociar combustíveis.

Já movimentando grandes volumes de plásticos e produtos químicos pelo mundo, em 2016 Torras entrou no negócio de afretamento de navios e gestão logística; mais tarde, separou a operação na Lighthouse Chartering, na qual ainda mantém participação.

Ao longo do caminho, Torras se separou de seus três cofundadores. Jeffrey McNear vendeu sua participação de 15% em 2008, após se esgotar com negociações incessantes, e mais tarde se uniu a outros ex-traders da Tricon em um empreendimento de curta duração. Desde então, tem se dedicado à construção de uma clínica de catarata em Honduras.

Torras afirma que comprou a parte de Alfaya em 2000, depois que suas operações passaram a se tornar especulativas, tentando prever movimentos de mercado com base na “Teoria das Ondas de Elliott”, um tipo de análise técnica que enxerga os mercados financeiros como padrões em forma de ondas guiados pela psicologia dos investidores. Alfaya não respondeu aos pedidos de comentário.

No fim, “ele construiu o que queria construir”, diz McNear sobre Torras. “Tenho orgulho de ter feito parte disso.” Hoje, Torras detém mais de 90% da empresa. Em 2016, tentou trazer um CEO para cuidar do dia a dia, enquanto ele se concentraria nas negociações.

Mas o novo executivo lhe disse que ele era controlador demais. Torras retomou o cargo: “Depois de um ano, percebi que eu não era um CEO tão ruim assim”.

Impulsionando crescimento e mais obstáculos

A pandemia, seguida pela guerra na Ucrânia, elevou preços e desorganizou a logística, resultando em anos excepcionais para a Tricon. “Os melhores ciclos químicos acontecem quando há inflação de matérias-primas e aumento de juros”, o que incentiva a estocagem, diz Torras.

De 2020 a 2022, as receitas dobraram para US$ 10 bilhões (R$ 55,1 bilhões). As condições de mercado começaram a se deteriorar em 2023, com o excesso de oferta.

Em vez de se retrair, Torras partiu para novas aquisições. Amparado por US$ 2,7 bilhões (R$ 14,88 bilhões) em linhas de crédito de instituições como Société Générale e a japonesa Mitsui Marubeni, ele gastou milhões de dólares para comprar empresas em dificuldades ou em liquidação. Entre elas: três terminais e cinco armazéns no México, por meio da aquisição em 2023 dos maiores distribuidores de plásticos e produtos químicos da Pemex, Q-Logistics e Polymat; a eXsource, braço de distribuição da falida empresa australiana de plásticos Qenos, em 2024; e 25% da West African International, distribuidora sul-africana sediada em Durban e parceira da gigante química Sasol, no início deste ano. “Em tempos ruins, prepare-se para tempos bons”, diz Torras.

As tarifas de Trump agravaram ainda mais os problemas do setor, elevando custos. Para proteger seus negócios globais, a Tricon ajuda clientes a fazer hedge de preços e a evitar tarifas ao substituir remessas de produtos químicos sujeitos a impostos por derivados que não são tarifados.

As importações de benzeno da Coreia do Sul, por exemplo, caíram pela metade desde que Trump impôs tarifas de 25%, mas, por sugestão da Tricon, seus clientes passaram a substituir o benzeno por derivados isentos, como acetona (um solvente e insumo para plásticos) e estireno monômero (ingrediente essencial para espumas, tintas e borracha).

No topo 

Tudo isso proporcionou a Torras uma vida de luxo, que inclui um amplo complexo em estilo mediterrâneo, com telhado de telhas, portas de carvalho e uma fonte importada da Espanha; uma coleção de jarros de cerâmica feitos por Pablo Picasso; e dois restaurantes espanhóis.

Seu BCN Taste & Tradition, de inspiração catalã, administrado em parceria com o chef espanhol Luis Roger, recebeu uma estrela Michelin no ano passado. “São muitas receitas de avós, mas brincamos que a avó nunca fez comida tão boa assim”, diz Torras.

Há anos, ele também organiza partidas de futebol em um campo no quintal de casa. Há três anos, inspirado por seus dois afilhados jogadores de futebol no espectro autista, lançou o United Genuine FC, um time de Houston formado exclusivamente por jogadores neurodivergentes, alguns com autismo severo ou síndrome de Down.

Em 2024, Torras criou um torneio inteiro para atletas neurodivergentes, a Genuine Cup. O evento mais recente, realizado em agosto de 2025, reuniu 800 jogadores e 30 equipes de todo o mundo no estádio da Rice University. “Alguns times são tão fracos que não marcaram um único gol”, comenta. Mas isso é secundário: “Para pessoas autistas, o desafio são os relacionamentos. Esportes coletivos melhoram drasticamente essas relações.”

Também em Houston, Torras abriu a Rocambolesc, onde uma equipe inteiramente neurodiversa serve sorvetes espanhóis. “Ele realmente quer se envolver com pessoas diferentes dele”, afirma Ruth Lopez Turley, diretora do Kinder Institute for Urban Research da Rice University, que pesquisa a comunidade neurodiversa em Houston. “Existem 25 milhões de pessoas neurodivergentes no mundo”, observa Torras. “Quando você as integra, elas humanizam você.”

Torras não hesita em atrair a elite de Houston e clientes da Tricon para ajudar a cobrir o custo anual de mais de US$ 2 milhões (R$ 11,02 milhões) do torneio Genuine. Isso inclui almoços no BCN para patrocinadores como Telemundo, Bank of America e Goya, além de convencer o bilionário do beisebol Jim Crane — que doou mil ingressos para que as equipes assistissem a um jogo do Houston Astros — a contribuir.

“Ele é uma força real na comunidade”, diz Silvia Salle, private banker do Bank of America em Houston. “Todo mundo quer conhecer o Nacho.”

Os planos para 2026 já estão em andamento. Recentemente, o bilionário do setor de energia e entusiasta do futebol John Arnold visitou a casa de Torras; Arnold preside o comitê organizador dos sete jogos da Copa do Mundo da FIFA de 2026 que serão realizados em Houston.

Torras cedeu o diretor de sustentabilidade da Tricon para colaborar com o comitê de Arnold. Após o fim da Copa, Torras pretende realizar a maior Genuine Cup até hoje.

De volta à Tricon, a postura de Torras é um pouco mais agressiva. Com US$ 13 bilhões (R$ 71,63 bilhões) em receitas em 2024, a empresa é a segunda maior trader de produtos químicos, segundo a ICIS, tendo ultrapassado a Univar, que faturou US$ 12 bilhões (R$ 66,12 bilhões) e foi comprada em 2023 pela Apollo Global Management e pelo fundo soberano de Abu Dhabi por US$ 8,1 bilhões (R$ 44,63 bilhões).

Torras agora se aproxima da líder Brenntag, a empresa alemã com US$ 16,3 bilhões (R$ 89,71 bilhões) em receitas e valor de mercado de US$ 7 bilhões (R$ 38,57 bilhões). “Eles nos veem pelo retrovisor”, diz Torras. “Estamos chegando.” Logo depois de um cochilo.



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