Home » Direita vê ideologia em Havaianas e transforma chinelo em guerra cultural

Direita vê ideologia em Havaianas e transforma chinelo em guerra cultural

by admin

Por Esmael Morais – Blog do Esmael

A polêmica das Havaianas escancarou como a direita brasileira passou a tratar publicidade como militância política. Após um comercial estrelado por Fernanda Torres, setores do bolsonarismo anunciaram boicote à marca ao interpretar a frase sobre não começar 2026 com o “pé direito” como provocação ideológica.

A reação segue um padrão recente da direita, que transforma campanhas publicitárias em disputas simbólicas e convoca boicotes como forma de militância cultural. Bastou um chinelo para parte do campo conservador concluir que a sandália ganhou ideologia, partido e, quem sabe, título de eleitor. O pé, agora, também vota.

De repente, o solado virou suspeito. Parlamentares passaram a listar marcas “permitidas”, influenciadores gravaram vídeos indignados e houve quem jurasse nunca mais pisar numa borracha potencialmente comunista. Nunca um par de Havaianas provocou reflexão tão profunda sobre lateralidade política. Para alguns, o calcanhar esquerdo virou marxista e o direito, vítima de censura publicitária.

Do outro lado, a resposta veio em tom de deboche institucional. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), prometeu comparecer às sessões do próximo ano calçando Havaianas, como quem lembra que o plenário já sobreviveu a coisas piores do que dedos à mostra. No Paraná, Arilson Chiorato (PT), líder da oposição na Assembleia Legislativa, aderiu ao figurino e elevou o chinelo à condição de traje oficial da resistência parlamentar de verão.

No Planalto, aliados relatam que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avalia usar Havaianas como símbolo de alinhamento com os mais pobres na campanha pela reeleição. A mensagem seria direta, governar de pé no chão, sem sapato importado nem verniz elitista. A oposição, claro, já enxerga subversão até no solado.

O filme é reprise. Em 2023, a direita declarou guerra ao chocolate Bis, da Mondelez Brasil, produzido em Curitiba. O estopim foi a contratação do youtuber Felipe Neto para uma campanha publicitária. Houve hashtag, vídeos em supermercados e juramentos de boicote nas redes.

O efeito prático foi o oposto do desejado. Segundo Célio Bolinha, presidente do sindicato dos trabalhadores da empresa, o Sintrafucarb, o episódio coincidiu com aumento no consumo e na produção, o que resultou em mais contratações na fábrica instalada na capital paranaense.

Arilson Chiorato, Paulo Pimenta e Wadih Damous pedem “bis” para Lula em 2026 (Foto: Reprodução)

O padrão se repete com precisão e já tem nome na ciência política, a politização do consumo como extensão da guerra cultural. Produtos populares viram bodes expiatórios, o carrinho do supermercado se transforma em urna simbólica e o debate público escorre para a prateleira.

Na prática, quem ganha com a polêmica das Havaianas não é a esquerda nem a direita, mas a Alpargatas, controlada desde 2017 pela Itaúsa. Ou seja, o barulho ideológico acaba convertendo engajamento político em valorização de marca para o andar de cima, os mesmos oligarcas do sistema financeiro da Faria Lima que historicamente operam em sintonia com a velha mídia e lucram quando o debate público é deslocado da economia real para guerras simbólicas de consumo.

Aliás, Fernanda Torres é uma das garotas-propaganda do Itaú Unibanco em 2025. Ela estrelou campanhas de fim de ano ao lado da mãe, Fernanda Montenegro, além de protagonizar a série Tá Feito sobre educação financeira, evidenciando uma versatilidade que parece escapar aos bolsonaristas mais atentos ao solado do chinelo do que ao currículo da atriz.

Enquanto isso, o brasileiro médio segue indo à padaria de chinelo, alheio à guerra imaginária travada nas redes. A polêmica das Havaianas diz menos sobre a marca e mais sobre um campo político que vê ameaça em tudo. Quando até sandália vira panfleto, talvez o problema não esteja no pé direito nem no esquerdo. Está na cabeça.

Continue acompanhando os bastidores da política e do poder pelo Blog do Esmael.

Aqui está a propaganda que deixou ensandecida a direta bolsonarista:

 



Créditos

You may also like