Em uma manifestação realizada nesta quinta-feira (04), dezenas de pessoas se reuniram para protestar contra a atuação da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), empresa estatal submetida à gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) na promoção do acesso à moradia digna dos habitantes da Favela do Moinho, localizada na região central de São Paulo.
Os moradores caminharam até a sede da companhia para pedir explicações sobre a demora para a conclusão das mudanças e regularização do acesso às unidades habitacionais. Mesmo permanecendo no local por horas, nenhum funcionário do órgão se disponibilizou a atender os moradores.
Os manifestantes também exigiram acesso a moradias prontas, já que muitos deles têm recebido um auxílio aluguel no valor de R$ 1,2 mil por mês. “Queremos respeito pelas famílias que ainda estão lá, somos vidas, não somos bichos”, disse Cíntia Bonfim, padeira que vive na comunidade.
De acordo com os moradores,167 famílias ainda não foram atendidas pela companhia e seguem sem perspectiva de onde morar. Outras 60 pessoas tiveram seus cadastros indeferidos para avançar no processo de garantia da moradia.
Diante da morosidade, eles temem que suas casas sejam demolidas em meio às festas de final de ano. “Queremos sair daqui, mas a CDHU não agiliza os cadastros, estou há um mês aguardando a vistoria da casa e não sai. O combinado foi chave a chave e não o bolsa aluguel”, critica Alexsandra da Silva, orientadora socioeducativa e habitante do Moinho há 15 anos em meio a manifestação que contou com um grande contingente de policiais militares e até mesmo a cavalaria da corporação.
O acordo chave a chave, a que Alexsandra se refere foi firmado junto ao governo federal em maio deste ano, nele o direito a um imóvel gratuito de até R$ 250 mil seria concedido para cada família, desse montante R$ 180 mil seriam pagos pelo “Minha Casa, Minha Vida”, da União, e o restante, pelo programa estadual “Casa Paulista”. No mês seguinte, o próprio presidente Lula esteve na Favela do Moinho e reiterou a promessa junto a ministros do seu governo.
Para além disso, desde que o governo Tarcísio decidiu reassentar os moradores uma série de violações têm ocorrido na comunidade. Segundo os manifestantes, militares têm intimidado e abordado moradores. “A polícia reprime o tempo todo”, conta Alexsandra. “Segunda-feira agora tomamos bomba, policial assustando. Parem com isso! A gente vive uma guerra dentro da comunidade. Parem de oprimir a Favela do Moinho”, desabafou Cintia.
O processo de remoção dos moradores começou em abril deste ano. Já o cadastramento das famílias que deveriam ser reassentadas ocorreu entre outubro e novembro do ano passado.
A CDHU vem oferecendo aos habitantes um auxílio aluguel no valor de R$ 1,2 mil mensal e um auxílio-mudança de R$ 2,4 mil a ser pago em uma parcela única, o que, segundo os moradores, não supre a necessidade para alugar uma moradia no centro da capital paulista.
Segundo os moradores, no Moinho cerca de 250 famílias não tem para onde ir, elas aguardam respostas da CDHU. Após as demolições, a favela se tornou um local insalubre, segundo as pessoas que por lá ficaram, que relatam haver muito pó saindo dos escombros e entulho. “Tem escorpião, ratos, as pessoas estão ficando doentes com problemas respiratórios”, relata Alexsandra.
Outro ponto destacado pelos habitantes do Moinho é a violência policial. Segundo eles, agentes vêm “aterrorizando, roubando, manipulando, assediando e coagindo” homens e mulheres da comunidade.
Aos gritos de: “Respeita o Moinho, respeita o morador, queremos chave a chave retira o trator”, a imigrante peruana Teresa Quispe Arango, aguarda o acesso a uma moradia depois de ter concluído o processo de cadastramento na CDHU. Ela conta que 15 famílias estrangeiras do Peru, Bolívia, Venezuela e Paraguai vivem na comunidade do Moinho.
Mãe de um jovem com deficiência visual que a acompanhava no ato, Arango se divide entre os cuidados com o filho, o trabalho e a incerteza em permanecer na casa que ela teme ser demolida a qualquer momento. “Falaram que eu tenho que aguardar mais dois meses para analisarem a documentação da carta de crédito. Temos medo que a polícia invada as casas no Natal. Não há nenhum atendimento para pessoas especiais.”

Luana dos Santos vive com o neto em um quartinho no Bom Retiro, ela recebe o auxílio aluguel e conta que o valor não é suficiente para arcar com todas as despesas. “Eu junto mais um pouco com o Bolsa Família. Eu morei aqui por 19 anos, chorei muito quando derrubaram a minha casinha e não me deram outra para eu morar com dignidade. Eles não dão nenhum prazo para isso.”
A iniciativa de remoção da comunidade Moinho pela gestão Tarcísio está diretamente ligada ao projeto que o governo define como “revitalização da região central”, com a favela localizada a menos de um quilômetro da futura sede administrativa do governo na Praça Princesa Isabel.
Paralelamente à alegação oficial de que a comunidade estaria sob domínio do Primeiro Comando da Capital (PCC), a área da favela é de alto interesse imobiliário. O governador Tarcísio de Freitas manifestou a intenção de transformar o terreno em um parque, o que exige a cessão da posse da área, atualmente pertencente à União e sob gestão do governo Lula, para o estado.
A reportagem questionou a CDHU e o Ministério das Cidades do Governo Federal sobre as solicitações dos moradores, mas não obteve retorno até o momento.
Já a Polícia Militar, enviou uma nota em que afirma não restringir o acesso à comunidade e que respeita integralmente o direito de ir e vir dos moradores.
“Todas as ações policiais no local têm como objetivo garantir a segurança dos moradores e das equipes envolvidas no processo de realocação das famílias em unidades habitacionais disponibilizadas pela CDHU. Abordagens e revistas pessoais realizadas pela PM seguem estritamente os parâmetros legais e ocorrem somente diante de atitudes ou situações suspeitas, conforme previsto na legislação e nas normas operacionais da corporação”, diz a nota.
