Home » Floresta Amazônica está em risco de desequilíbrio permanente e novo regime climático “hipertropical”

Floresta Amazônica está em risco de desequilíbrio permanente e novo regime climático “hipertropical”

by admin

Pesquisadores liderados pelo geógrafo Jeff Chambers, da Universidade da Califórnia, publicaram um estudo na revista Nature em que mostram que a Floresta Amazônica pode estar se aproximando de um regime climático nunca visto na Terra nos últimos 10 milhões de anos, denominado “clima hipertropical”.

Segundo os cientistas, o novo regime climático se caracteriza por secas severas e prolongadas associadas a temperaturas extremamente altas, muito além daquelas observadas na faixa tropical atual, que podem ocorrer por até 150 dias no ano até 2100, inclusive durante as estações chuvosas.

Esse padrão de comportamento climático é completamente diferente das condições típicas do clima tropical e só existiu durante períodos muito mais quentes do passado geológico da Terra, explicam os pesquisadores, ao longo do Eoceno e do Mioceno, ocorridos há dezenas de milhões de anos.

O estudo, que combina mais de 30 anos de dados climáticos e biológicos coletados em florestas próximas à cidade de Manaus, capital do Amazonas, considera informações como a temperatura e a umidade média do solo, a intensidade da luz e o fluxo de seiva nas árvores para mostrar como os períodos de seca se tornam mais longos e frequentes no norte amazônico.

De julho a setembro, por exemplo, quando ocorre a estação seca na Amazônia, o nível de aquecimento elevou as temperaturas médias e estendeu o período para além dos meses tradicionais. As secas de 2024, consideradas as mais longas já registradas na Amazônia, quando combinadas à falta de água que empurra o ecossistema para além dos limites tropicais normais, criam um “novo normal” climático.

Leia também: Colapso total, bilhões de reais e espécies ameaçadas: o segundo maior bioma brasileiro corre risco de desaparecer | Revista Fórum

O estudo identificou dois mecanismos principais pelos quais as árvores sucumbem ao estresse hídrico e térmico. O primeiro deles se relaciona à umidade do solo, que, quando cai abaixo de 33% do volume considerado normal, faz com que as árvores entrem em um estado de sobrevivência marcado pela economia hídrica.

Para evitar essa perda de umidade não convencional, as árvores amazônicas fecham seus estômatos, os poros presentes nas folhas responsáveis pela troca gasosa que permite às árvores absorverem CO2.

Como resultado, a conversão de carbono não acontece, o que prejudica a fotossíntese e o crescimento da vegetação.

Além disso, com secas prolongadas e calor extremo, bolhas de ar tendem a se formar na seiva das árvores (em um fenômeno chamado de “embolismo”), o que interrompe o fluxo normal de água pelo xilema e equivale a um coágulo sanguíneo em humanos. Isso leva, gradualmente, à morte das árvores.

Esses processos foram observados durante secas associadas a eventos de El Niño em 2015 e 2023.

Atualmente, a taxa anual de mortalidade de árvores na Amazônia é pouco acima de 1% ao ano. No entanto, em um cenário marcado por altas emissões de gases de efeito estufa, o estudo projeta que essa mortalidade pode subir para cerca de 1,55% ao ano até 2100, um percentual que, em grande escala, considerando a extensão da floresta amazônica (de aproximadamente 6,7 a 7,4 milhões de km²), representa um grande número de árvores perdidas.

As espécies conhecidas por apresentar crescimento mais rápido e madeira menos densa, como aquelas comuns em florestas secundárias, são mais vulneráveis às mudanças, enquanto árvores de crescimento mais lento podem se tornar mais predominantes à medida que a floresta seja submetida a períodos prolongados de estresse hídrico e térmico.

O cenário preocupa principalmente porque a Amazônia é um dos principais sumidouros de carbono do planeta, e sua degradação pode contribuir significativamente para acelerar o aquecimento global, criando um ciclo de realimentação positiva.

Em 2021, um estudo conduzido com base em dados coletados por satélites indicava que a Amazônia, tomada por monoculturas de soja e pastagens para a pecuária, já emite mais CO2 do que absorve, com 0,87 bilhão de toneladas de CO2 por ano apenas na parte brasileira. Os dados apontavam a maior frequência de incêndios no período como a principal causadora do saldo negativo, além do impacto do desmatamento sobre o balanço hídrico e a pluviosidade na floresta.

De acordo com projeções, se não houvesse desmatamento e queimadas, a Amazônia brasileira poderia remover cerca de 0,19 bilhão de toneladas de CO2 por ano.

Os autores do estudo sugerem que essa transição para um clima hipertropical pode não ser exclusiva da Amazônia, mas se estender a florestas tropicais em outras partes do mundo, incluindo o oeste da África e o Sudeste Asiático.

“Depende de nós até que ponto vamos criar esse clima hipertropical. Se continuarmos emitindo gases de efeito estufa sem controle, esse regime aparecerá mais cedo”, comentam à agência de notícias da Universidade da Califórnia, em Berkeley.

Comunicar erro Encontrou um erro na matéria? Ajude-nos a melhorar

Créditos

You may also like