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Lira é reverenciado por deputados enquanto Motta patina para pacificar plenário

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Sem conseguir contornar o ambiente hostil dos últimos dias na Câmara, o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), vem acumulando críticas pelos embates em plenário e é torpedeado pela falta coordenação dos trabalhos. Na terça-feira, enquanto o parlamentar era pressionado até mesmo por aliados, o seu antecessor, o deputado Arthur Lira (PP-AL), foi reverenciado e acionado por governistas para tentar mudar os rumos da pauta. 

Após uma manhã e tarde marcadas pela tensão, a reportagem do GLOBO acompanhou o momento em que Lira entrou no plenário, no início da noite, e imediatamente atraiu a atenção de deputados que o trataram como se ainda comandasse a Mesa.

Assim que atravessou o corredor central, três parlamentares do baixo clero o cercaram e o saudaram como “o presidente que colocaria ordem na Câmara”. 

A aparição de Lira, rara desde que deixou o cargo, ocorreu enquanto Motta era questionado por abuso de autoridade após a retirada forçada de Glauber Braga (PSOL-RJ), e no mesmo momento em que parlamentares de esquerda o acusavam de perder a condição de permanecer como presidente da Casa. 

Parlamentares próximos ao presidente da Câmara reconhecem que o episódio de Glauber — que envolveu corte da transmissão da TV Câmara, expulsão da imprensa da galeria — criou um dano instantâneo à sua imagem e levantou dúvidas sobre sua capacidade de conduzir a sessão.

Governistas como José Guimarães (PT-CE) e Alencar Santana (PT-SP) passaram o início da noite tentando localizar Lira nos corredores para pedir que ele intercedesse e convencesse Hugo a adiar a sessão do projeto da Dosimetria. 

Integrantes da articulação relataram telefonemas, recados e até tentativas de interceptá-lo entre o plenário e as salas de liderança. Lira ouviu todos, sem se comprometer — um padrão conhecido entre deputados: raramente assume o custo explícito de segurar ou liberar uma pauta, mas sua disposição em ouvir já é interpretada como um gesto político.

Os comparativos também foram muitos ao longo da noite. Parlamentares reclamavam de Motta, afirmando que Lira, por mais difícil que fosse a pauta, sempre comunicava com antecedência. 

 A leitura entre governistas era de que Hugo, pressionado por bolsonaristas para avançar com a dosimetria, estava menos permeável ao diálogo.

O simbolismo da noite se ampliou quando Motta desceu da Mesa para conversar com Guimarães. Deputados que presenciaram a cena afirmam que o movimento ocorreu logo após o pedido de interlocução feito a Lira, reforçando a percepção de que o ex-presidente da Câmara ainda funciona como um padrinho para o atual. 

A sessão não foi adiada; a dosimetria foi aprovada, assim como o projeto do devedor contumaz, prioridade do governo, que acompanhou a sessão com apreensão.

A influência de Lira nos rumos do plenário não data de agora. O ex-presidente já havia sido decisivo na costura que permitiu destravar a votação do IR e também foi acionado no episódio em que bolsonaristas ocuparam a Mesa Diretora, quando a oposição tentou negociar com ele a votação da anistia e da PEC da Blindagem antes de recuar. 

Deputados próximos a Lira mencionam que, mesmo após deixar o cargo, ele manteve uma rede de influência baseada em fidelidade de quadros médios, interlocução diária com líderes e trânsito confortável entre governo e oposição, uma engenharia que Motta ainda não teria consolidado.

Há duas semanas, quando a crise entre o Legislativo e Executivo escalonou, Lira foi à cerimônia de sanção do IR, no Palácio do Planalto. Motta e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) se ausentaram. 

Na ocasião, recebeu elogios do governo e foi alçado ao posto de interlocutor no Congresso por aliados do Planalto.

Na terça, esse papel quase informal de árbitro voltou a se impor. Deputados se aglomeravam ao redor de Lira para pedir opinião sobre a dosimetria — e até conselhos eleitorais. Nikolas Ferreira, por exemplo, quis saber o que o ex-presidente achava de uma eventual candidatura dele ao Senado em 2030.

Por volta das 23h30, antes da votação da dosimetria, Lira deixou o plenário discretamente.

A aprovação da dosimetria, na madrugada, selou um duplo revés: para o governo, que não conseguiu adiar o texto, e para Hugo Motta, que terminou o dia mais fragilizado do que começou.

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