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Lula lidera reunião do Conselhão e critica agronegócio por derrubada de vetos ao PL da Devastação

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou nesta quarta-feira (4), da abertura da 6ª Reunião Plenária do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), conhecido como Conselhão, no Palácio Itamaraty, em Brasília. O evento reuniu ministros e conselheiros com a missão de debater políticas estratégicas e diretrizes de governo, formuladas através do diálogo com a sociedade civil, além de algumas entregas, entre as quais a atualização da legislação brasileira para relações internacionais e a Estratégia de Compras Públicas Sustentáveis.

Criado em 2003, o Conselhão deve levar as demandas da sociedade diretamente ao presidente da República, ajudando a construir políticas públicas mais eficazes. Discussões do conselho deram suporte para a criação programas como o Minha Casa, Minha Vida e o Programa de Aceleração do Crescimento.

O chefe do Executivo aproveitou a intervenção para criticar o agronegócio que, segundo ele, operou pela derrubada dos vetos ao chamado “PL da Devastação”, que flexibilizou as regras para o licenciamento ambiental no país. O projeto tinha recebido 63 vetos presidenciais, dos quais 56 foram derrubados pelo Congresso Nacional, com apoio da bancada ruralista.

“Nós não vetamos porque não gostamos do agronegócio. Nós vetamos para proteger o agronegócio. Porque essa mesma gente que vetou, que derrubou meus vetos, quando a China parar de comprar soja, quando a Europa parar de comprar soja, quando alguém parar de comprar nossa carne, quando alguém parar de comprar o algodão, vão vir falar comigo outra vez. ‘Presidente, fala com o Xi Jinping. Presidente, fala com a União Europeia. Presidente, fala com a Rússia […]’. Porque eles sabem que estão errados. Eles sabem que nós queremos que a nossa produção seja cada vez maior, mas cada vez mais sustentável e cada vez mais limpa. Eu não quero o mundo limpo para mim. A gente quer o mundo limpo para todo mundo”, disse o presidente.

Lula também pediu ao Conselhão que elabore propostas para a redução da jornada de trabalho sem redução dos salários, além de uma medida “mais contundente” para o enfrentamento da violência contra as mulheres. 

“Eu queria que esse conselho estudasse com muito carinho essa proposta da jornada de trabalho, para acabar com essa escala 6 por 1, porque não tem mais sentido. Não tem mais sentido nesse país, com os avanços tecnológicos que temos”, defendeu o presidente.

“Nós queremos colocar um fim no feminicídio”, agregou Lula. “Essa é uma coisa que eu acho que esse conselho tem que pensar e apresentar uma proposta dura para que não seja uma proposta do presidente da República, seja uma proposta da sociedade civil brasileira”, sugeriu o mandatário

Resultados positivos

Os ministros Fernando Haddad, da Fazenda, e Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais, destacaram os bons números do atual governo.

“Nós vamos terminar os quatro anos de governo com um crescimento médio de 2,8%, que é o maior desde o FHC 1 [primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso], com exceção dos dois mandatos do presidente Lula. Ou seja, ele só perde para ele mesmo”, destacou Haddad.

“Já no desemprego, o senhor não está perdendo nem para o senhor”, brincou o ministro. De acordo com Haddad, esta vai ser a menor taxa de desemprego média em quatro anos. “Desde o começo da série histórica nós vamos terminar com 6,6% de média, porque na margem nós estamos com 5,4. A menor taxa de emprego veio com veio acompanhada com a menor informalidade e subtilização do mercado de trabalho. A informalidade caiu para 37,9 e a subutilização caiu para 14,7. O mercado de trabalho aquecido junto à política de valorização do salário mínimo elevou o rendimento salarial médio para um patamar recorde”.

“Além da prosperidade econômica nesse governo, a inflação, que é uma preocupação legítima de todo cidadão, em quatro anos vai ser a menor da história, de toda a história, do império, da República, da República Velha, do Estado Novo, do Plano Real, a menor inflação da história em quatro anos”, completou.

Por sua vez, Hoffmann destacou que o Brasil atingiu em 2024 o menor nível de pobreza e desigualdade já registrado na série histórica do IBGE, o que atribui à “combinação da retomada do crescimento com recorde na geração de empregos, dos aumentos reais do salário mínimo e de políticas massivas de transferência de renda”.

“Estamos conscientes de que é preciso fazer muito mais para enfrentar a herança da desigualdade estrutural, racial e de gênero, que é a chaga histórica em nosso país”, afirmou a ministra, que também destacou a condução do governo nas negociações com os Estados Unidos sobre a imposição de tarifas a produtos brasileiros.

“Ao longo desses quatro meses, o presidente Lula estabeleceu um diálogo direto e altivo com o presidente Trump, que já resultou na retirada de parte significativa das tarifas. Eu lembro, presidente, que o senhor disse que comercialmente estava disposto a negociar tudo. Não tínhamos limite para a negociação, mas não negociaria a nossa soberania, o processo judicial brasileiro e nosso processo político. Observadores de todo o mundo destacam a vitória diplomática e pessoal do presidente brasileiro, que não se curvou às pressões para surpresas de muito, muitos, mas não de quem conhece sua trajetória e seu compromisso de vida com o Brasil e com o povo brasileiro”, avaliou. 

Temas da agenda

Na abertura do encontro, foi apresentado ao presidente da República o anteprojeto da Lei Geral de Direito Internacional Privado, sendo um texto elaborado por uma Comissão Especial do Conselhão em parceria com o Superior Tribunal de Justiça. Este projeto estabelece regras claras sobre a jurisdição e o reconhecimento de decisões tomadas no exterior em casos transnacionais. Além disso, o texto é inovador ao trazer regras específicas para a proteção de grupos vulneráveis, como consumidores, crianças e idosos.

Coube ao ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Felipe Salomão, que participou da elaboração da iniciativa. Segundo ele, as intensas transformações na sociedade mundial experimentadas ao longo do século 20 demandaram a atualização das regras que regem as relações jurídicas no campo privado, especialmente no cenário das relações internacionais.

“Qual a lei, presidente, a ser aplicada quando uma empresa brasileira assina um contrato com outra empresa estrangeira e ocorre uma disputa sobre a melhor interpretação para o pacto celebrado. Quando ocorre um acidente no Brasil envolvendo um navio e tripulação estrangeira com afretamento e carga de países diferentes, qual o judiciário que vai julgar o caso? Um casal domiciliado no Brasil, mas com bens e filhos no exterior, que deseja o divórcio. Qual a lei a ser aplicada? Quando um estrangeiro vem a falecer no Brasil, deixando bens no exterior, qual a lei que vai reger sucessão? Hoje em dia, temos apenas alguns poucos artigos que tratam deste e de outros temas de grande importância na lei de introdução às normas do direito brasileiro elaboradas no distante ano de 1942”, pontuou o ministro, destacando ainda o esforço coletivo para a elaboração do texto, que agora será encaminhado ao Congresso Nacional.

“Todas essas matérias receberam tratamento adequado na proposta que hora encaminhamos e apresentamos a Vossa Excelência. O projeto foi fruto de consenso em uma comissão composta por renomados e reconhecidos juristas e especialistas no assunto, notadamente constituída no âmbito deste conselho. Para esta finalidade, realizados diversos encontros e audiências públicas com os mais variados setores que tenham correlação com o assunto”, afirmou.

Foco em compras e sustentabilidade

Outro ponto em debate nesta 6ª reunião plenário do Conselhão é a Estratégia de Compras Públicas Sustentáveis, que busca estimular a economia e a indústria nacional, promovendo processos mais sustentáveis e a inclusão social. As compras feitas pelo governo desempenham um papel central no desenvolvimento sustentável, pois não devem considerar apenas o menor preço, mas também gerar valor público, incluir socialmente e incentivar a indústria. Como parte desta estratégia, a ministra da Gestão e Inovação no Serviço Público (MGI), Ester Dweck, entregou ao presidente o texto do Decreto que institui o programa. 

“Esse decreto traz benefícios concretos de uma coordenação federativa que não seja só o governo federal trabalhando na utilização do poder de compra e sim todas as esferas no Brasil. Tem diretrizes claras e maior segurança jurídica para que os agentes públicos possam usar os instrumentos já previstos em leis sem medo de questionamentos. Da legitimidade ao ministério, junto com a comissão interministerial para articular grandes compras federais e as principais e aliar elas principais políticas de governo e tá alinhando a Estratégia Nacional de Compras Públicas ao PPA (Programa de Aquisição de Alimentos) e ao plano de logística sustentável e ao plano de contratações anuais”, explicou a ministra, agregando que o plano está organizado em quatro grandes eixos, sendo eles, o eixo econômico, um eixo social, um eixo ambiental e um eixo de gestão. 

Também na agenda econômica, foi apresentado o Guia das Duplicatas Escriturais, que trata da obrigatoriedade do registro eletrônico de títulos, uma medida que visa reduzir o custo do crédito e aumentar a transparência. Espera-se que isso amplie a competição entre instituições financeiras, incluindo bancos, fintechs e Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs).

O secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto, afirmou que a duplicata digital será facultativa em 2026, passando a ser obrigatória a partir de 2027. E destacou a importância da medida para o combate a fraudes.

“A grande fonte de financiamento, as pequenas empresas não têm garantias para dar. Qual que é a grande fonte delas para dar de garantia para obter financiamento mais barato? São seus recebíveis, são suas duplicatas, são seus recebíveis de cartão de crédito. Só que a estrutura da duplicata cartular em papel não dava nenhuma segurança para o sistema para fazer essa esse desconto de recebido. Às vezes a duplicata era descontada duas vezes, às vezes a duplicata não existia. Isso aumenta muito o custo de crédito para as empresas. Com a escrituração digital, tudo isso vai acabar. A duplicata não vai ser mais emitida eh fisicamente, ela vai ser só emitida eletronicamente com todas as salvaguardas para que a gente não tenha fraude, não tenha burocracia. Isso vai fazer com que as pequenas e médias empresas vão poder duplicar, descontar essas duplicatas a um custo muito mais baixo”, explicou o secretário.

COP 30

O encontro também abordou temas ambientais. Foi feito o balanço das atividades desenvolvidas pelos integrantes do Conselho relacionadas à COP30, o que inclui o lançamento do Livro Digital da Comunidade Científica e Tecnológica da Amazônia. O papel de liderança do Brasil no debate foi destacado pela secretária-executiva do Ministério das Relações Exteriores (MRE), Maria Laura da Rocha.

“Na COP 30, o Brasil liderou debate inédito sobre o futuro dos combustíveis fósseis. Por consenso, foram aprovadas 29 decisões com destaque para o compromisso de triplicar o financiamento destinado à adaptação, demanda histórica dos países mais afetados. Um dos resultados mais celebrados da COP 30 foi a consolidação de uma robusta agenda de implementação que posiciona o setor privado como agente central na execução das soluções climáticas e materializou-se em instrumentos que permitem a participação direta do capital privado na transição para uma economia de baixo carbono”, afirmou a diplomata, destacando o “sucesso” do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, por sua sigla em inglês), lançado pela presidência brasileira à frente da COP.

“O Fundo Florestas Tropicais para sempre, o famoso TFFF, é um exemplo importante dessa nova fase. Trata-se de mecanismo inovador de financiamento misto público privado que já mobilizou mais de 6.7 bilhões de dólares e foi endossado por 63 países”, disse a embaixadora. “Terminamos a COP com a sensação de missão cumprida, mas cientes do grande desafio que teremos pela frente em 2026, quando a presidência brasileira seguirá trabalhando rumo à COP 31”, concluiu.

Adicionalmente, foi detalhado o Portfólio de Investimentos Sustentáveis, uma parceria que mapeia investimentos públicos e privados visando a transformação ecológica do Brasil. A plataforma identificou mais de 2.780 projetos, localizados em 832 municípios, somando mais de R$ 473 bilhões em investimentos.

Críticas à taxa de juros

Em sua intervenção, o secretário Marcos Pinto criticou a elevada taxa básica de juros mantida pelo Banco Central (BC). “Presidente, o senhor, como eu e como muitos brasileiros, temos um inconformismo com a taxa de juros no Brasil, com a taxa Selic, que é realmente muito alta. E a gente precisa trabalhar para reduzi-la, mas os empresários e os trabalhadores que estão aqui hoje sabem que a taxa Selic mesmo alta em 15% não é o custo dos empréstimos que eles tomam junto ao sistema bancário. A gente tem hoje 20 pontos percentuais, 20% a mais em cima da Selic de spread bancário no Brasil. O custo médio do crédito no sistema bancário brasileiro hoje ainda é de 35%. Nos países envolvidos, esse spread que no Brasil é de 20, nos países envolvidos é de 6%. E nós não estamos falando só de países como Japão ou e Noruega que tem spread de 1%. O México, nosso vizinho tem um spread de 6%”, destacou.

No mesmo sentido, a ministra Gleisi Hoffmann afirmou que a atual taxa básica de juros “não guarda relação com a realidade” brasileira. 

“O plano safra da agricultura familiar deste ano é o maior da história. 78 bilhões no Pronaf [Acessar o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar] a juros de 3% para a produção de alimentos da cesta básica. É um enorme esforço do governo, levando em conta uma taxa básica de juros de 15% ao ano que não guarda relação com a nossa realidade econômica. E a despeito disso, a economia cresce de forma sustentável, melhorando a vida das pessoas”, destacou a ministra.

As críticas também vieram do setor privado, como foi o caso da executiva Luiza Trajano, dona da rede de lojas Magazine Luiza. “Falo como empresária, como cidadão e como alguém que acredita profundamente no nosso país. Os juros estão muito altos. Não tem cabimento esse juro. O juro alto. Eu sei que tem muita gente virando o olho para mim, mas é a minha voz geral há muito tempo. O juro alto atinge profundamente, como foi dito aqui, a pequena e a microempresa”, declarou Trajano.

Pilares de um projeto de nação

Outra entrega do Conselhão ao presidente Lula foi o documento intitulado “Pilares de um projeto de nação”, uma revisão planos estratégicos do país a partir de um diagnóstico atualizado da realidade brasileira e projeções para os próximos dez anos. 

“É muito trabalho que tem pela frente para entregar daqui a alguns anos esse Brasil soberano, justo, democrático e sustentável, que supere as desigualdades históricas e que valoriza a diversidade”, destacou a economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a quem coube apresentar alguns dos principais pilares e ações contidos no plano. 

“No pilar ‘trabalho digno, sistema de proteção social e equitativo’, eu gostaria de destacar a ação que busca acelerar a transformação digital inclusiva, promovendo tecnologias complementares ao trabalho e geradoras de renda e emprego. A tecnologia pode, sim, ser parceira na criação de mais e melhores empregos. Para isso, o Brasil precisa desenvolver e dominar tecnologias que melhorem nossos processos produtivos e a vida da sociedade como um todo”, pontuou.

“No pilar ‘ciência e tecnologias soberanas e equitativas’”, seguiu Marcolino, “destaco a ação desenvolver infraestrutura digital de conectividade e processamento soberana inclusive que também se conecta ao ponto anterior. É preciso investimento, muito. Sei que temos limites orçamentários, mas também sei que somos um povo criativo e capaz de pensar caminhos para superar esses constrangimentos”, afirmou. 

“Aqui no pilar desenvolvimento territorial sustentável e justo, destaca ação incorporar as características territoriais nas estratégias de desenvolvimento e nas políticas públicas. O Brasil é um país continental. As médias nacionais muitas vezes não retratam a realidade dos diferentes territórios. Temos fortes desigualdades regionais, mas também grandes potencialidades. Precisamos ampliar nossa capacidade de formular políticas públicas aderentes as especificidades dos diversos territórios brasileiros”, completou a diretora do Dieese, agregando o pilar ‘política macroeconômica e orçamento público favorável ao crescimento justo’, que prevê a revisão do regime de metas de inflação e reavaliar seus parâmetros.

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