A decisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de estimular a pré-candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) ao Palácio do Planalto provocou tensões internas no bolsonarismo e abriu um período de desgaste especialmente sentido por Michelle Bolsonaro. A ex-primeira-dama, que vinha acumulando protagonismo político, passou a demonstrar insatisfação com o novo arranjo e perdeu espaço nas definições estratégicas para 2026.
O movimento de Bolsonaro reposicionou o centro de poder dentro do grupo político da família. Embora aliados reconheçam que Flávio ainda enfrenta forte resistência do Centrão, a sinalização de que ele será o nome apoiado pelo pai teve efeitos imediatos. A leitura entre parlamentares é de que o gesto ajudou a destravar o avanço do projeto de dosimetria das penas relacionadas à tentativa de golpe, que beneficia diretamente Bolsonaro. A proposta foi aprovada pela Câmara dois dias após Flávio afirmar publicamente que haveria “um preço” caso recuasse da disputa presidencial.
No PL, interlocutores admitem que o senador participou das articulações, mas atribuem a decisão de levar o tema ao plenário ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Mesmo assim, o episódio consolidou Flávio como ator central nas negociações políticas do grupo.
Não abre mão
Após o avanço do projeto, o senador passou a reforçar, tanto em declarações públicas quanto em conversas reservadas, que não pretende abrir mão da candidatura. Na tentativa de ampliar apoios, promoveu um jantar com lideranças do Centrão na semana passada. Relatos de participantes indicam, no entanto, que o encontro foi marcado por cautela e pouca disposição para um acordo.
Enquanto Flávio buscava protagonismo, Michelle Bolsonaro adotou postura oposta. A ex-primeira-dama reduziu drasticamente a agenda pública, suspendeu viagens e se afastou do comando cotidiano do PL Mulher, função que vinha exercendo de forma ativa. Em nota, o núcleo feminino do partido informou que Michelle enfrenta questões de saúde e que o desgaste emocional causado pela prisão do marido e por ataques à família teria afetado sua imunidade.
Aliados próximos, porém, reconhecem que o afastamento vai além de motivos pessoais. Nos bastidores do partido, dirigentes relatam que Michelle passou a externar desconforto com decisões tomadas sem sua participação, sobretudo após o aval explícito de Bolsonaro à candidatura do filho. Em conversas reservadas, ela teria afirmado que precisaria “se contentar com o Senado”, frase que passou a circular internamente como retrato do mal-estar instalado.
O desalinhamento ficou evidente durante uma visita de Michelle e Flávio a Jair Bolsonaro na sede da Polícia Federal, onde o ex-presidente está detido. Segundo relatos, Bolsonaro celebrou o avanço da proposta de redução de penas e reiterou que seguirá apostando no filho como candidato. Michelle, por sua vez, teria feito um desabafo direto, reclamando de ter sido excluída das decisões centrais do projeto político.
Melhor momento
A tensão contrasta com o cenário de poucas semanas antes, quando Michelle vivia seu momento de maior ascensão dentro do PL. Ela havia interferido diretamente em articulações regionais, como no Ceará, onde ajudou a reverter o apoio do partido a Ciro Gomes — movimento que contrariou a posição de Flávio, Eduardo e Carlos Bolsonaro. O episódio foi interpretado internamente como sinal de que a ex-primeira-dama deixava de ser apenas um ativo eleitoral para se tornar voz decisiva nas estratégias para 2026. À época, aliados chegaram a dizer que “ninguém segura mais Michelle”.
Publicamente, porém, a ex-primeira-dama evitou demonstrar o incômodo e desejou sucesso ao enteado. Flávio retribuiu o gesto e passou a afirmar que Michelle terá papel relevante no próximo ciclo eleitoral, ressaltando ser o filho com melhor relação com ela.
Procurados, Michelle Bolsonaro e Flávio Bolsonaro não comentaram o assunto. Aliados trataram de minimizar o conflito. O deputado Bibo Nunes (PL-RS) afirmou que todos seguem “em completa sintonia”. Já o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), reforçou que Michelle deve permanecer à frente do PL Mulher e indicou que o plano do partido é lançá-la candidata ao Senado em 2026, afastando a possibilidade de seu nome integrar uma chapa presidencial.
Com informações do Globo
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