Mediado pela jornalista Livia Torres, o encontro aproximou especialistas, autoridades, empresários e cidadãos em um debate sobre soluções reais e possíveis para construir, de forma coletiva, o futuro da mobilidade urbana. Participaram do primeiro painel, “O Rio não para: mobilidade como caminho para o desenvolvimento”, o vereador Carlo Caiado, presidente da Câmara Municipal do Rio; Clarisse Linke, diretora-executiva do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP Brasil); Mauro Ribeiro Viegas Filho, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e presidente do Conselho Empresarial de Infraestrutura; e Thiago Curvello, chefe- -executivo do Centro de Operações (COR-Rio).
Quando você cria um equipamento público estruturante e o insere no Plano Diretor, evita deslocamentos longos, melhora a qualidade de vida
— CARLO CAIADO, presidente da Câmara Municipal do Rio
Abrindo o painel, o vereador Carlo Caiado destacou que a mobilidade urbana precisa ser tratada como uma prioridade permanente e estruturante e reforçou o papel da Câmara Municipal na criação de políticas que reorganizem os modais.
— Quando assumi a presidência da Câmara, em 2021, o Rio vivia um verdadeiro colapso no sistema de transporte municipal. Tivemos muita coragem para discutir e aprovar mudanças que reestruturaram o BRT — lembrou, ressaltando a importância do Plano Diretor como instrumento para orientar o crescimento urbano e reduzir deslocamentos desnecessários:
Avançamos na integração dos modais: o Terminal Gentileza conecta ônibus, BRT e VLT
— MAÍNA CELIDÔNIO, secretária municipal de Transportes
— Um exemplo é o Parque de Realengo. Quando você cria um equipamento público estruturante e o insere no Plano Diretor, evita deslocamentos longos, melhora a qualidade de vida e leva desenvolvimento para áreas antes esquecidas.
Precisamos de um planejamento que priorize o deslocamento de pessoas, não de veículos, e isso exige recursos e ação
— CLARISSE LINKE, diretora-executiva do ITDP Brasil
Representando o ITDP Brasil, Clarisse Linke defendeu uma abordagem de mobilidade urbana centrada nas pessoas — com prioridade ao transporte público, à segurança viária, ao incentivo aos deslocamentos ativos e à redução das desigualdades territoriais.
— Precisamos de um planejamento que priorize o deslocamento de pessoas, não de veículos. Essa mudança de paradigma exige recursos e ação — exemplificou.
Estamos avançando para um sistema de transporte mais moderno, amplo e transparente
— MÁRCIO RIBEIRO, vereador
Pelo setor empresarial, Mauro Ribeiro Viegas Filho, da Firjan, ressaltou que a infraestrutura de transporte é um dos pilares do desenvolvimento econômico da cidade.
— Há cerca de 15 grandes projetos estruturantes em análise ou implantação no estado, todos voltados para ampliar a oferta de transporte público de qualidade.
O uso de dados em tempo real permite antecipar problemas, otimizar fluxos e reduzir impactos de tráfego, clima e eventos urbanos
— THIAGO CURVELLO, chefe-executivo do Centro de Operações
O chefe-executivo do COR-Rio, Thiago Curvello, apresentou uma visão prática sobre como tecnologia, integração e monitoramento inteligente já estão transformando a mobilidade carioca. Ele explicou que o COR funciona como um grande hub de informações, reunindo dados de trânsito, transporte público, clima, segurança e eventos urbanos:
Quando o poder público cria os incentivos certos, as pessoas deixam o carro em casa
— FLÁVIO VALLE, vereador
— O uso de dados em tempo real permite antecipar problemas, otimizar fluxos, reduzir impactos de eventos climáticos e melhorar a experiência dos cidadãos. A integração de informações facilita a tomada de decisões.
Transporte que transforma
No segundo painel, “Transporte que transforma: o papel dos trens, ônibus e VLTs na revitalização do Rio”, gestores públicos, especialistas, representantes do setor empresarial e cidadãos chegaram a um consenso: integrar trens, ônibus e o VLT Carioca não apenas uma solução técnica — é uma estratégia capaz de revitalizar bairros, impulsionar a economia e ampliar o acesso à cidade.
Há cerca de 15 grandes projetos estruturantes em análise ou implantação no estado, todos voltados para ampliar a oferta de transporte público de qualidade
— MAURO RIBEIRO VIEGAS FILHO, vice-presidente da Firjan
A secretária municipal de Transportes, Maína Celidônio, explicou que os investimentos atuais da prefeitura estão focados na ampliação, na modernização e na conexão inteligente entre modais:
— Avançamos na integração dos modais: o Terminal Gentileza, primeiro intermodal do Rio, conecta ônibus, BRT e VLT. Também evoluímos bastante ao transformar as estações da Transoeste em terminais com integração cicloviária. Hoje, os bicicletários somam 600 vagas, todas constantemente ocupadas, de forma ordenada.
Representando o Legislativo, os vereadores Flávio Valle e Márcio Ribeiro enfatizaram que mobilidade urbana é uma política social. Transporte não é apenas deslocamento, é acesso a oportunidades, trabalho e inclusão. Líder do governo do prefeito Eduardo Paes, Ribeiro ressaltou o papel da Câmara Municipal na articulação com o governo estadual para promover uma integração mais ampla.
— O Jaé, novo sistema de bilhetagem digital, rompeu o monopólio das empresas de ônibus sobre as informações do transporte e permitiu que a prefeitura finalmente tivesse acesso aos dados necessários para formular políticas públicas. O esforço valeu: estamos avançando para um sistema de transporte mais desenvolvido, amplo e transparente — disse Ribeiro. Já o vereador Flávio Valle defendeu que a eficiência na mobilidade depende diretamente de incentivos adequados:
— Quando o poder público cria os incentivos certos, as pessoas deixam o carro em casa. Só os incentivos podem nos levar à eficiência do transporte público. Isso é política de mobilidade urbana.
Transporte é um dos principais critérios para a decisão de investimento em um território
— MARCELO HADDAD, diretor-executivo da Rio Negócios
O diretor-executivo da Rio Negócios, Marcelo Haddad, levou ao debate a perspectiva do desenvolvimento econômico, ressaltando que cidades que organizam bem seus sistemas de transporte conseguem atrair mais investimentos, fortalecer o turismo e transformar por completo áreas urbanas.
— Transporte é um dos principais critérios para a decisão de investimento em um território. Mas, para que essa infraestrutura, que é cara, realmente floresça e gere desenvolvimento econômico, é indispensável ter ordenamento urbano — pontuou.
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Tecnologia a serviço da integração dos modais cariocas
Segundo dia do evento destacou inovações que prometem transformar o Rio em um lugar onde as pessoas sejam prioridade nas políticas públicas de deslocamento
Após um primeiro dia de debates sobre os desafios atuais da mobilidade urbana no Rio de Janeiro, o segundo e último dia do seminário “O Rio do Futuro” discutiu as inovações que prometem transformar a cidade. Mais uma vez mediado pela jornalista Lívia Torres, o evento — realizado pela Editora Globo e pelo Sistema Globo de Rádio, com apoio da Câmara do Rio — reuniu especialistas, autoridades e cidadãos. O painel “Transporte inteligente, cidade melhor: o futuro já começou?” abordou como a tecnologia pode ser uma aliada fundamental para criar um sistema de transporte mais eficiente e integrado.
Para o cidadão, pouco importa o modal: ele quer chegar rápido e com menor custo. O grande salto é a padronização de tarifas e bilhetes
— PEDRO DUARTE, vereador
O vereador Pedro Duarte destacou que, embora o Rio ainda tenha muito a avançar, esbarra em limitações orçamentárias. Mesmo assim, ressaltou que melhorias simples e urgentes são possíveis, como a integração efetiva entre os modais.
O orçamento é uma questão, mas precisamos ter vontade política. Existem estudos de viabilidade. Deslocar-se pela cidade não pode ser um privilégio
— MONICA BENÍCIO, vereadora
— O Rio é muito mais que uma cidade, é o maior polo de geração de empregos da Região Metropolitana. Não faz sentido que um bilhete funcione para Caxias, mas não para o Rio; para o metrô, mas não para o VLT. Para o cidadão, pouco importa o modal, ele quer chegar rápido e com menor custo. O grande salto é a padronização de tarifas e bilhetes — afirmou Pedro, que também destacou a importância de integrar a habitação ao debate sobre mobilidade citando a Zona Oeste, região que liderou por anos os lançamentos imobiliários, enquanto a maior parte dos empregos continuou concentrada no Centro, sobrecarregando o transporte. Com o Porto Maravilha, a expectativa é trazer a habitação para a discussão, incentivando a morar com maior infraestrutura e oferta de transporte.
Desigualdades históricas
A vereadora Monica Benício complementou, ressaltando que a falta de integração agrava desigualdades históricas. Criada na Maré, ela lembrou que o deslocamento é um direito básico e deve ser universal — e defendeu a implementação da Tarifa Zero, propondo que o transporte público seja gratuito em quatro anos.
Se é mais barato estacionar na rua do que pagar uma tarifa de ônibus, criamos um incentivo perverso
— CRISTINA ALBUQUERQUE, especialista em mobilidade urbana
— O orçamento é uma questão, mas precisamos ter vontade política. Existem estudos de viabilidade. Deslocar-se pela cidade não pode ser um privilégio. Isso gera produção de renda — afirmou.
A especialista em mobilidade urbana e consultora do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) Cristina Albuquerque reforçou que a mobilidade deve priorizar o bem-estar da população. Segundo ela, “precisamos buscar soluções para as pessoas, e não para o modal”. Ela também apontou uma distorção frequente nas grandes cidades:
A gente se orgulha de apoiar o ‘Distrito de Baixa Emissão’, área piloto no Rio para modais não poluentes
— GABRIEL TENENBAUM, diretor de Implementação da C40
— Se é mais barato estacionar na rua do que pagar uma tarifa de ônibus, criamos um incentivo perverso. Calçadas, segurança pública e infraestrutura de acesso também estão no centro do debate, porque, quando falham, afastam as pessoas das opções mais sustentáveis.
A crise climática, em destaque no pós-COP30, permeou a fala de Gabriel Tenenbaum, diretor de Implementação da C40 na América Latina — rede global de prefeitas e prefeitos comprometidos com o desenvolvimento sustentável. No Rio, ele apontou o Reviver Centro como um passo importante, mas reforçou que as inovações precisam chegar às periferias. — A gente se orgulha de apoiar o ‘Distrito de Baixa Emissão’, que será área piloto para modais não poluentes. O transporte público segue estratégico, com teleféricos e ônibus 100% elétricos — disse, destacando que o Rio já avançou ao revitalizar o BRT, e a eletrificação deve ser o próximo passo:
A verticalidade é o que garante uma melhor acessibilidade à cidade, mas para atingi-la precisamos reorganizar o Rio
— MIGUEL LAGO, diretor-executivo do Ieps
— A eletrificação do transporte não só permite a redução das emissões de carbono, como faz com que a viagem tenha mais qualidade, com menos ruído, e isso gera inclusive valorização imobiliária.
Acesso e autonomia nos deslocamentos
O segundo painel do seminário “O Rio do Futuro” debateu o tema “Do acesso à autonomia: o transporte que faz diferença na vida real”. O vereador Rogério A morim destacou que garantir autonomia ao trabalhador começa por evitar que ele perca um quarto de seu dia no trânsito.
O deslocamento não pode ser um estorvo para o carioca. A população quer uma integração maior
— ROGÉRIO AMORIM, vereador
— O deslocamento não pode ser um estorvo para o carioca. A população quer uma integração maior, principalmente entre município e estado, e controle e de qualidade — afirmou.
O vereador Rafael Satiê defendeu que o Rio deve se inspirar em grandes metrópoles globais, citando soluções tecnológicas que melhoram a experiência do usuário, como apps que mostram a localização dos ônibus em tempo real. Ele reforçou a importância de elementos que ampliam a acessibilidade — pisos táteis, painéis sonoros e ônibus com elevadores.
A tecnologia permite que melhoremos a usabilidade do usuário nos transportes públicos
— RAFAEL SATIÊ, vereador
— A tecnologia permite que melhoremos a usabilidade do usuário nos transportes públicos — disse.
Já o diretor-executivo do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps), Miguel Lago, apontou que, na sua visão, o modelo de organização urbana do município é problemático. Para ele, o Rio não aproveitou a oportunidade de reverter a horizontalidade da cidade, que sobrecarrega o sistema de transporte, antes dos Jogos Rio 2016.
— Precisamos aprender com os erros do passado. A verticalidade é o que garante uma melhor acessibilidade à cidade, mas para atingi-la precisamos reorganizar o Rio — afirmou o diretor do Ieps.
Trabalhamos com o conceito da cidade de cinco minutos
— GUSTAVO GUERRANTE Secretário municipal de Desenvolvimento Urbano
O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Gustavo Guerrante, informou que a prefeitura já atua para diminuir o espraiamento da cidade, trazendo a população para onde já existe mais infraestrutura, reduzindo o tempo de deslocamento da população:
— O melhor do deslocamento é reduzir o deslocamento. Trabalhamos com o conceito da cidade de cinco minutos — explicou o secretário, citando a conclusão do BRT TransBrasil e do Terminal Gentileza como projetos que mudaram a vida do carioca, já que esses corredores fazem com que os cidadãos usem transporte público.
