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Por que algumas pessoas só falam de si mesmas, segundo a ciência

by admin

Quem nunca passou por uma situação desconfortável em uma roda de amigos ou colegas de trabalho? Durante uma conversa casual, alguém pergunta o que você faz da vida. Você responde com naturalidade, talvez com um certo orgulho — fruto de anos de esforço e dedicação. Em seguida, outra pessoa no grupo toma a palavra e passa a se autopromover de forma excessiva, destacando conquistas, cargos e feitos, diminuindo implicitamente os demais. O clima muda. Ninguém gosta disso.

Mas por que demonstrar orgulho costuma ser socialmente aceito, enquanto gabar-se gera rejeição? A ciência comportamental ajuda a explicar essa diferença.

De acordo com especialistas, sentir orgulho moderado está associado ao reconhecimento do próprio valor e pode ser saudável para a autoestima. Já a autopromoção exagerada costuma ser percebida como falta de empatia e necessidade de validação constante. Estudos mostram que falar sobre si mesmo ativa áreas do cérebro ligadas ao prazer, liberando dopamina — o mesmo neurotransmissor associado a recompensas como comer ou fazer sexo. Em outras palavras, gabar-se pode ser prazeroso para quem fala, mas não necessariamente para quem escuta.

As redes sociais intensificam esse fenômeno. Plataformas profissionais, por exemplo, incentivam a exposição constante de conquistas, promoções e resultados, criando um ambiente propício à comparação e à vanglória. Cada curtida ou comentário positivo funciona como uma pequena “dose” de recompensa no cérebro, reforçando esse comportamento.

A cientista comportamental Irene Scopelliti investigou esse tema em um experimento com 131 trabalhadores. Os participantes responderam a um questionário no qual relembravam situações em que se gabaram de algo ou em que alguém se gabou para eles. Em seguida, descreveram suas próprias emoções e aquelas que acreditavam ter provocado no outro durante a interação.

Os resultados revelaram um padrão consistente: pessoas que se autopromoveram superestimaram o quanto seus ouvintes ficaram felizes e orgulhosos delas e subestimaram o quanto causaram incômodo ou irritação. Já os ouvintes, ao relembrar episódios em que foram alvo de vanglória alheia, relataram sentimentos predominantemente negativos. Curiosamente, ambos os grupos tiveram dificuldade em imaginar como se sentiriam se os papéis fossem invertidos.

Em palestras e artigos, Scopelliti define esse fenômeno como “lacuna de empatia” — a dificuldade que as pessoas têm de se colocar genuinamente no lugar do outro e compreender o impacto real de suas ações. Essa lacuna ajuda a explicar por que a autopromoção é tão comum, apesar de seus efeitos sociais negativos.

Especialistas também apontam que a vanglória pode assumir formas mais sutis, como a autopromoção “humilde” ou disfarçada de reclamação. Em todos os casos, o comportamento parece estar ligado à busca por validação externa e ao preenchimento de um vazio emocional, reforçado pelas recompensas químicas do cérebro.

A diferença entre orgulho e gabar-se, portanto, não está apenas no conteúdo do que é dito, mas na intenção e no impacto sobre os outros. Enquanto o orgulho pode fortalecer relações e identidade, a vanglória tende a afastar — mesmo que, para quem fala, ela seja momentaneamente prazerosa.

Para especialistas, esse mecanismo ajuda a explicar por que a autopromoção persiste mesmo quando gera rejeição social. Em termos práticos, muitas pessoas sentem prazer não apenas em falar de si mesmas, mas também em provocar admiração ou até inveja nos outros, ainda que de forma inconsciente. Ao perceber sinais de comparação, surpresa ou desconforto no interlocutor, o cérebro interpreta a situação como uma confirmação de status ou valor pessoal, liberando mais dopamina. Esse ciclo de recompensa faz com que o comportamento se repita, mesmo que o custo seja o desgaste das relações sociais e a construção de uma imagem negativa diante dos outros.

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