Em meio à intensificação das ondas de calor provocadas pelas mudanças climáticas, a Câmara Municipal de Porto Alegre aprovou, nesta quarta-feira (17), um Projeto de Lei que estabelece medidas de proteção à saúde e à segurança de trabalhadores que atuam ao ar livre durante períodos de calor extremo. De autoria do vereador Giovani Culau (PCdoB), a proposta garante a suspensão das atividades nesses dias sem prejuízo salarial e reforça a obrigação do poder público de adotar condições adequadas de trabalho frente ao agravamento da crise climática.
A medida contempla servidores municipais e trabalhadores terceirizados, como garis e profissionais de serviços de zeladoria, e não se aplica às atividades consideradas essenciais. O texto prevê ainda o fornecimento de água potável, vestimentas apropriadas ao clima e à estação do ano, além da ampliação de pausas durante jornadas em dias de altas temperaturas.
O projeto foi apresentado em fevereiro deste ano, período em que o Rio Grande do Sul enfrentava uma das mais severas ondas de calor de sua história. Na ocasião, Porto Alegre registrou 37,3ºC, enquanto o município de Quaraí alcançou 43,8ºC – a maior temperatura oficialmente registrada no estado nos últimos 115 anos, segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
Porto Alegre teve 3 mil mortes em razão do calor extremo
“As mudanças climáticas têm provocado a intensificação de eventos extremos, seja chuvas extraordinárias e acima da média, seja ondas de calor extremo. Entre os anos 2000 e 2018, nós tivemos mais de 3 mil óbitos em Porto Alegre em razão do calor extremo. É a partir daí que surge a nossa proposição de um projeto de lei que libera os trabalhadores expostos ao sol, aqueles que trabalham ao ar livre, de trabalhar em dias de calor extremo”, afirmou Culau ao Brasil de Fato RS, quando o projeto foi apresentado.
O Projeto de Lei do Trabalho em Calor Extremo define essas condições como temperaturas significativamente acima da média, associadas a elevados índices de radiação solar e a riscos concretos à saúde humana. A regulamentação da medida será orientada por alertas da Defesa Civil, o que estabelece critérios técnicos e objetivos para a suspensão das atividades.
De acordo com o paramentar estudos reforçam a gravidade do cenário. A Região Metropolitana de Porto Alegre ocupa a quarta posição entre as áreas com maior número de mortes potencializadas por ondas de calor no país, de acordo com levantamento do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Conforme a pesquisa, 3.810 mortes registradas entre 2000 e 2018 podem ser atribuídas ao calor extremo na capital gaúcha.
Na justificativa do projeto, Culau e o mandato coletivo destacam que a recorrência e a intensificação das ondas de calor ampliam os riscos de desidratação, exaustão térmica e insolação entre trabalhadores expostos, além de comprometer a segurança e aumentar a probabilidade de acidentes de trabalho. Nesse contexto, a regulamentação é apresentada como uma medida preventiva e essencial para a preservação da vida.
Conforme aponta o vereador experiências internacionais indicam caminhos semelhantes, como na Espanha. Legislações recentes passaram a restringir atividades ao ar livre, como a limpeza urbana e o trabalho agrícola, durante períodos de calor extremo, como forma de adaptação às novas condições climáticas e proteção dos trabalhadores.
O alerta também vem de organismos internacionais. Em relatório divulgado em abril de 2024, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que mais de 2,4 bilhões de trabalhadores – cerca de 70% da força de trabalho global, estão expostos ao calor excessivo em algum momento de suas atividades.
“É evidente que as alterações climáticas já estão a criar riscos adicionais significativos para a saúde dos trabalhadores. É essencial que prestemos atenção a esses avisos. As considerações de segurança e saúde no trabalho devem tornar-se parte das nossas respostas às alterações climáticas, tanto nas políticas como nas ações”, afirmou a chefe da Equipe de Segurança e Saúde Ocupacionais da OIT, Manal Azzi.
“Diante da nova realidade climática, defender a vida deve ser nosso objetivo comum, com prioridade para o cuidado aos trabalhadores e trabalhadoras que são os mais expostos aos eventos climáticos extremos, como as ondas de calor. Esse é o sentido principal desse projeto aprovado”, concluiu Culau.
