Hugo Motta sob pressão: crise na Câmara com retirada à força de Glauber Braga, censura à imprensa e corte na TV Câmara
A tarde de terça-feira, 9 de dezembro, expôs o lado mais autoritário da presidência de Hugo Motta na Câmara dos Deputados. Em poucas horas, o presidente da Casa mandou a Polícia Legislativa arrancar o deputado Glauber Braga da cadeira da Presidência, ordenou a retirada de jornalistas do plenário e determinou o corte da transmissão da TV Câmara. As imagens correram o país e acenderam o alerta: até onde vai o poder do terceiro na linha de sucessão presidencial?
Enquanto isso, nas redes, a marca de desgaste político de Motta ficou ainda mais evidente. Hashtags antigas, como “Congresso inimigo do povo”, voltaram a circular com força em posts de artistas, parlamentares e movimentos sociais, cristalizando a percepção de um Parlamento distante da sociedade e blindado contra críticas.
Sessão tensa termina com Glauber Braga carregado pela Polícia Legislativa
O episódio começou quando Glauber Braga (PSOL-RJ), em ato de resistência política, ocupou a cadeira da Presidência da Câmara. Ele protestava contra a decisão de pautar a análise de sua cassação e contra a votação do chamado PL da dosimetria, que reduz penas de condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro.
Após se recusar a deixar o assento, o deputado foi cercado por agentes da Polícia Legislativa e retirado à força da Mesa Diretora, sob gritos de colegas e tumulto no plenário. Vídeos mostram Glauber sendo imobilizado e carregado pelos braços, em uma cena rara na história recente do Parlamento.
Ainda durante a confusão, Hugo Motta anunciou que caberá ao plenário decidir sobre a cassação do mandato do parlamentar, que já responde a um processo no Conselho de Ética. Em declarações posteriores, o presidente da Câmara acusou Glauber de desrespeitar “a própria Câmara dos Deputados” e classificou a atitude dele como “gesto autoritário”.
Dois pesos, duas medidas: tolerância com a direita, força contra a esquerda
A reação imediata contra Glauber Braga reacendeu a comparação com outro episódio recente. Em agosto, parlamentares ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro ocuparam as Mesas Diretoras da Câmara e do Senado, passaram a noite no Congresso e bloquearam o funcionamento regular das Casas para pressionar pela votação de anistia aos condenados pelos atos de 8 de janeiro.
Naquele momento, Hugo Motta tratou a ocupação como “inaceitável”, mas evitou determinar uma ação imediata da Polícia Legislativa. A desocupação só ocorreu após horas de negociação e construção de um acordo político, em um cenário que permitiu à oposição de extrema direita transformar o plenário em palco permanente de protesto.
Agora, diante da ocupação de um único deputado da esquerda, a resposta foi radicalmente distinta. Em vez de diálogo prolongado, vieram o uso imediato da força policial, o esvaziamento do plenário e o silêncio imposto à transmissão oficial. Para críticos de Hugo Motta, o contraste revela um padrão de “dois pesos e duas medidas” na condução da Casa, com tratamento mais brando a grupos alinhados à direita radical e mão de ferro contra vozes dissidentes do campo progressista.
Expulsão da imprensa e corte da TV Câmara acendem alerta de censura
Se a retirada física de um deputado já chocou parte da opinião pública, as medidas seguintes ampliaram a reação negativa. Assim que a confusão se instalou, jornalistas de diversos veículos relataram ter sido expulsos do plenário por ordem da Presidência, enquanto câmeras eram desligadas e o sinal da TV Câmara era cortado, interrompendo a transmissão ao vivo.
Entidades que representam profissionais de imprensa, como a Fenaj e sindicatos de jornalistas, divulgaram notas de repúdio. Elas denunciaram agressões, empurrões e impedimentos ao trabalho de repórteres, classificando as ações como um grave atentado à liberdade de imprensa e ao direito da sociedade de acompanhar, em tempo real, o que acontece dentro da Casa Legislativa.
Parlamentares de esquerda foram além e compararam o corte de transmissão e a retirada da imprensa a práticas do período da ditadura militar, quando o Congresso funcionava sob censura e vigilância direta dos militares. Para esses grupos, desligar o canal oficial do Legislativo e expulsar jornalistas é um gesto incompatível com o discurso de defesa da democracia que o próprio Hugo Motta costuma fazer em público.
Da “defesa da democracia” ao cerco à transparência
Ao ser eleito presidente da Câmara, em fevereiro, Hugo Motta levantou a Constituição em plenário, declarou “ter nojo da ditadura” e prometeu ser guardião da democracia, defendendo transparência total nos atos do Legislativo.
Menos de um ano depois, as cenas de repressão a um deputado em ato político, somadas ao corte do sinal da TV Câmara e à retirada da imprensa, alimentam a acusação de que o presidente da Casa abandonou, na prática, o discurso de transparência e pluralidade. Na avaliação de analistas e usuários de redes sociais, o episódio desta terça-feira virou símbolo de um mandato marcado pela aprovação da chamada PEC da Blindagem, pelo avanço do PL da dosimetria e por uma condução cada vez mais distante das demandas da sociedade.
Não por acaso, perfis de esquerda e de movimentos sociais passaram a se referir a Motta, em vídeos e postagens, como “ditadorzinho” da Câmara, em crítica direta ao estilo de comando e à tentativa de controlar a narrativa sobre o que acontece no plenário. Ao mesmo tempo, influenciadores e parlamentares resgataram a hashtag #congressoInimigodopovo, que já vinha sendo usada em protestos contra decisões do Parlamento em temas como justiça tributária e proteção de privilégios políticos.
Imagem desgastada e pressão crescente sobre a presidência da Câmara
Ainda não há pesquisas de opinião específicas sobre a popularidade de Hugo Motta após o episódio, mas o ambiente político indica desgaste. Ele já vinha sendo criticado por setores da sociedade civil e por lideranças políticas devido ao apoio a projetos vistos como autoprotectores para a classe política, como a PEC da Blindagem, e pela forma de conduzir pautas sensíveis relacionadas ao 8 de janeiro.
Agora, com a retirada à força de um deputado, a expulsão de jornalistas e o corte de um canal público de comunicação, o presidente da Câmara entra em uma zona de turbulência política. Bancadas de oposição prometem acionar o Supremo Tribunal Federal e o Conselho de Ética, além de cobrar explicações formais sobre a ordem de desligar a TV Câmara e de esvaziar o plenário. Entidades da imprensa, por sua vez, pedem garantias de que episódios de censura e violência institucional não se repetirão.
O recado das redes é direto: a sociedade não admite que a Casa que deveria representar o povo se feche em si mesma, expulsando jornalistas, silenciando transmissões oficiais e tratando a divergência política como caso de polícia. Em tempos de memória ainda viva dos anos de chumbo, qualquer presidente de Poder que flerta com a opacidade e o uso desmedido da força corre o risco de ser visto como inimigo da democracia que diz defender.
