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A Tenda de Convivência, armada em frente ao histórico Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, ficou pequena na noite desta segunda-feira (15). Com um público expressivo que misturava a “velha guarda” dos seringais e uma juventude vibrante, a abertura oficial da Semana Chico Mendes 2025, o Desaguar da COP30, transformou a celebração da memória em um ato de reafirmação política.
Entre vereadores, autoridades seringueiras e militantes que viajaram de longe, o clima era de reencontro. O dia, que começou com a movimentação da Feira da Economia Solidária e o credenciamento no Salão Paroquial, culminou em discursos que deixaram claro: 37 anos após sua morte, Chico Mendes não é apenas uma data no calendário, mas uma bússola moral e política para o presente.
Se estivesse vivo, Chico completaria 81 anos. Para sua filha, Angela Mendes, a presença massiva de jovens no evento é a prova de que o legado superou a morte física.
“Meu pai não era só um homem, ele é uma ideia viva. Tão viva que estamos aqui hoje celebrando suas ideias”, disse Angela, emocionada. Ela destacou a importância da passagem de bastão geracional: “É muito especial celebrar com os companheiros de luta do meu pai, os que vieram antes, e com essa juventude que chega firme, consciente, cuidando da carta que ele deixou para o futuro”.
Angela, no entanto, pontuou que a celebração acontece em um cenário adverso. Ela criticou duramente o atual Congresso Nacional citando o avanço do Marco Temporal e pautas de devastação ambiental, que contrastam com a abertura de diálogo do Governo Federal.
“Quem pede para despolitizar Chico, ignora a história”
Um dos momentos mais contundentes da noite veio na fala de Raimundão. O primo e companheiro de lutas de Chico Mendes usou sua autoridade histórica para rebater declarações de uma autoridade local que, recentemente, sugeriu que o nome de Chico deveria ser “despolitizado” para facilitar a captação de recursos.
“Isso é uma tentativa de fazer com que se interprete errado a luta que Chico fez. Chico foi, na sua essência, um político”, disparou Raimundão, sendo aplaudido pela multidão.
Ele lembrou que foi justamente a politização do movimento sindical que tirou os seringueiros da condição de semiescravidão no antigo “Inferno Verde” e garantiu a conquista das Reservas Extrativistas.
“Só ignora essa ação aqueles que não querem dar valor a essa heroica categoria”, completou.
Resistência
Raimundão também trouxe à tona a violência que ainda ronda a floresta. Ele relatou um episódio ocorrido em julho deste ano, quando foi hostilizado em um ato público no entroncamento local. Na ocasião, um opositor afirmou que o líder extrativista “já merecia ter morrido com um bocado de chumbo na cara, assim como Chico Mendes”.
A revelação gerou comoção na plateia. “É chato resistir, mas é necessário”, afirmou Raimundão, com a serenidade de quem já enfrentou jagunços e o latifúndio nas décadas de 70 e 80. Ele encerrou convocando a população a ter consciência no ano eleitoral que se aproxima, pedindo votos para candidatos que tenham sensibilidade com a causa dos trabalhadores.
O encerramento do primeiro dia ficou por conta do “Forró da Revolução”, reafirmando que a alegria também é uma forma de resistência cultural em Xapuri. A programação segue intensa nos próximos dias, mantendo vivo o espírito de que a Amazônia se defende com a floresta em pé e o povo altivo.
Imagens: José Lucas Alencar
